Doce ilusão.
Tudo correu bem durante os primeiros 15 ou 20 minutos: a turma participava interessada e motivada. Nesse momento entrou (atrasado, como sempre) um estudante bastante problemático e indisciplinado, que faz de tudo em sala de aula - excetuando participar das atividades propostas. Vindo de outra escola, apresenta sérios problemas de convivência desde o início do ano letivo, desrespeitando cotidianamente colegas e professores. Ao que tudo indica, ele não apresenta quaisquer transtornos psiquiátricos ou distúrbios cognitivos: é apenas um jovem mal educado e largado pela família.
Enfim, a entrada do garoto feriu de morte a minha aula. Gritos, batuques, provocações a colegas, brincadeiras inoportunas. As constantes interrupções que se fizeram necessárias quebraram completamente o ritmo da atividade proposta, ao mesmo tempo que três outros estudantes aderiam ocasionalmente ao tumulto, agravando a situação.
As atividades planejadas não foram desenvolvidas; sequer conseguimos concluir a primeira delas! UM aluno conseguiu prejudicar cerca de 20 colegas, inutilizando dois tempos de aula (custeados pelo contribuinte carioca, convém lembrar).
O caso - tristemente comum - ilustra os apuros do professor da rede pública. Ao que tudo indica, o único pleno sujeito de direitos na atual escola pública é o mau aluno. Seu direito de estar na escola (para quê?) está acima do bem e do mal. Acima, inclusive, do direito de seus colegas a uma educação de qualidade. Acima também do dever do professor de oferecer atividades pedagógicas consistentes e construtivas.
Obviamente não digo que esse aluno deve ser sumariamente expulso da educação pública. No entanto, de nada adianta tê-lo na escola APENAS como fator de perturbação, prejudicando a aprendizagem de inúmeros colegas. Alunos como esse, de fato, precisam de muitas coisas:
1) Limites - o que se torna difícil com um regimento escolar leniente, baseados em questionáveis e rasas interpretações do Estatuto da Criança e do Adolescente, que parecem esquecer que também o estudante interessado tem direito à educação - direito esse que lhe é cotidianamente usurpado. Também se torna difícil com um conselho tutelar completamente ausente e ineficiente.
2) Recursos humanos - mais inspetores e coordenadores pedagógicos, para começar; uma escola com mais de mil alunos não tem como funcionar satisfatoriamente com menos de 10 profissionais de apoio - que dirá com 6...
3) Atendimento especializado - psicólogo e, principalmente, assistente social que atue CONTINUAMENTE junto à família.
4) Reprovação - exatamente, a "palavrinha com R". É simplesmente inadmissível que um aluno de 12 anos chegue ao 6º ano analfabeto funcional e sem qualquer noção de regras de convívio; a vinculação das taxas de aprovação ao cálculo do IDEB é evidentemente parte do problema (cortesia do governo Lula).
5) Incentivos sociais adequados - que tal se benefícios como Bolsa Família (muito necessários, por sinal) não fossem condicionados apenas à presença do estudante na escola; por exemplo, se a família tivesse obrigação de comparecer periodicamente à escola?
Por outro lado, esse tipo de situação joga por terra clichês como "o aluno é indisciplinado porque a escola não é divertida, estimulante etc". O que mais seria possível fazer para "estimular" e "divertir" esse estudante?
Em suma, a escola precisa ser uma solução para esse tipo de aluno. Enquanto faltarem aos professores e demais profissionais da educação recursos como os mencionados, esses estudantes permanecerão como um estorvo para a escola e um empecilho à educação dos colegas, fragilizando o direito universal à Educação.
E aí, nem o mais inovador projeto pedagógico dá conta do recado...
"Tô chegando pra acabar com a aula!!!" |
Nenhum comentário:
Postar um comentário