Confesso que achei menos pior que os tais "guias politicamente incorretos" do mesmo autor. Não vi deslizes teóricos ou metodológicos excessivamente graves para um trabalho de divulgação. Discordo do posicionamento do autor acerca do tema e acho as interpretações dele forçadas, mas me parece um problema mais da ordem dos juízos de valor que da análise historiográfica propriamente dita.
Não me pareceu uma obra fraudulenta ou de má-fé. Há forçações de barra comparáveis em vários autores de esquerda. O autor já foi muito menos criticado por coisa muito pior produzida anteriormente. E talvez seja exatamente esse o problema: a obra incomoda mais por ser menos grosseira que as anteriores.
Justamente por não ser de todo ruim, o livro merecia críticas menos superficiais da parte dos especialistas. Muitas das críticas à obra que li ficam mais no plano do argumento de autoridade acadêmica que da refutação válida ao trabalho propriamente dito. Algumas parecem reproduções umas das outras, refletindo mais o eco dos corredores universitários que respondendo ao discurso do próprio autor. Fico com a impressão de que muita gente criticou sem sequer ler as orelhas do livro.
Acho que o historiador acadêmico/universitário precisa sair de sua zona de conforto, se quiser realmente se fazer ouvir no debate público. Não adianta simplesmente agarrar o diploma para bater na obra - não é assim que se conquista credibilidade junto ao público, especialmente quando falamos a partir de um campo que não goza de muito reconhecimento ou prestígio junto ao grande público, como é o caso das ciências humanas no Brasil.
Às vezes, a crítica superficial e precipitada pode ser mais daninha que o silêncio. Não adianta achar que nos basta de vez em quando descer de nossos páramos acadêmicos e trovejar olimpicamente para um público que acha que tudo em ciências humanas é apenas "questão de opinião". Tal postura só tende a confirmar e consolidar esse preconceito contra as ciências humanas.
Tudo isso me lembra certa ocasião em que participei de um evento de divulgação. Havia ali um público leigo interessado, que visivelmente acabara de sair do trabalho e, em lugar de ir para casa ou para a happy hour, resolveu ir assistir uma mesa redonda sobre História. Na minha opinião, isso deveria ser motivo de júbilo para o intelectual. Findo o evento, meu companheiro de mesa me confessa, entediado: "É por isso que não gosto desse tipo de evento - as perguntas são muito superficiais". Claro que sim! Que tipo de pergunta ele esperava de um público leigo?! Na ocasião, em minha insignificância de novato, me limitei a responder com um sorriso - pouco irônico, temo dizer.
Enquanto o historiador acadêmico continuar a menosprezar "esse tipo de evento" ou a responder preguiçosamente a "esse tipo de livro", nossa voz continuará a ser apenas um tímido eco pós-graduado perante os moucos ouvidos de uma sociedade que mal sabe ler e escrever...