Atualmente
o Natal é marcado por inúmeras tradições quase inevitáveis entre a maioria das
famílias. No entanto, esses costumes nada têm de fixo e invariável, e mudaram
muito ao longo do tempo. Como já lembrava o saudoso Eric Hobsbawn, a tradição anda sempre ao lado da invenção.
A própria data foi inventada pela Igreja Católica como
forma de facilitar a cristianização de povos pagãos que nesse período do ano
celebravam festivais religiosos pela chegada do inverno no hemisfério norte, como celtas, germânicos e eslavos.
Particularmente, no dia 24 de dezembro era cultuado o Sol Invicto, divindade oriental bastante popular
nos últimos séculos do Império Romano. Por outro lado, a Igreja Ortodoxa originalmente comemorava o Natal em 6 de
janeiro, o que ainda acontece em alguns países da Europa Oriental.
Por sinal, a julgar pelas características climáticas da Palestina e a crer nas características do relato bíblico, me parece pouco provável que Jesus tivesse nascido naquelas condições em época invernal. Em Belém, geralmente há pelo menos um dia de neve em dezembro - vá se fazer um parto numa estrebaria ou sair com carneiros a pastar num frio desses! Pelo contrário, se tivesse de fazer uma aposta, diria que ele nasceu entre maio e agosto...
Durante
séculos, a única tradição natalina realmente relevante em terras católicas (incluindo o
Brasil) era a Missa do Galo. Já o Protestantismo rejeitou em seus primeiros tempos a comemoração do
Natal como um hábito "papista". No século XIX a situação mudou, quando o Natal foi reinventado em terras reformadas. Boa parte das atuais tradições surgiram
nessa época em países com grupos protestantes enraizados, como a Alemanha (árvore de Natal),
Inglaterra (troca de presentes) ou EUA (peru).
Essas invenções só se
popularizaram no Brasil em meados do século XX, com a industrialização do país
e a exposição à cultura norte-americana, sob estímulo do comércio. As pessoas mais velhas de minha família vivenciaram de perto esse processo de transformação. Como minha avó me dizia hoje mesmo, o único hábito natalino em sua família era o consumo de bacalhau na ceia - sem Papai Noel, troca de presentes, árvore...
Mais ainda, as comemorações do Natal ganharam conotações indubitavelmente laicas, particularmente nos países onde não existe uma população cristã significativa. No Japão, por exemplo, é uma data onde os casais costumam trocar presentes e sair para um jantar romântico a dois - mesmo o aspecto familiar dos festejos é ignorado.
Também vale a pena sublinhar a exploração do Natal pelo Capitalismo; dezembro costuma ser o mês com maior índice de vendas. Por uma dessas sutis e infatigáveis mutações da história, o longuíssimo curso dos séculos transformou uma comemoração forjada para o proselitismo religioso em uma festividade laica com consequências econômicas incontornáveis...
Ante o consumismo que impera na época natalina, vale sempre a pena lembrar as palavras atribuídas ao aniversariante: "Não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a traça e o caruncho os corroem e onde os ladrões arrombam e roubam, mas ajuntai para vós tesouros no céu, onde nem a traça, nem o caruncho corroem e onde os ladrões não arrombam nem roubam; pois onde está teu tesouro aí estará também o teu coração".
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