"Alô, alô, Teresinha!"
O grito ecoa nas invisíveis paredes do contorcido e torturado espaço-tempo. Tragado por uma urna eletrônica, o Prof. Borges, intrépido explorador do desconhecido, tenta compreender sua incompreensível situação!
Uma atordoante buzina ressoa nos corredores da Eternidade, qual trombeta anunciando algum Juízo Final.
Brasileirinhas, brasileiríssimas, estonteantes chacretes seminuas bailam frenéticas, sensualmente honrando e glorificando os bons costumes, a moral cristã, a família tradicional brasileira e os fariseus de todo o sempre.
Uma chuva dourada cai de inimagináveis altitudes, fecundando a terra brasileira e confundindo-se com a estrepitosa gargalhada de Abelardo Barbosa. O Prof. Borges corre com todas as suas forças, mas o chão parece se desmanchar sob os pés de nosso herói.
"Vocês querem bacalhau?!"
A multidão brada alucinada. Milhões de mãos apedrejantes se erguem contra o Prof. Borges. "Comunista! Comunista! Comunista!" - ruge a turba enfurecida. Dedos apontam perigosamente, atiçados por encarniçadas chacretes que, como despudoradas tchutchucas, rebolam até o chão, seduzindo as arquibancadas e os arquibanqueiros. No longínquo horizonte, ao fundo do palco, um faminto e austero tigrão devora as carnes dos trabalhadores.
Abelardo Barbosa anuncia a próxima atração, em socorro do intrépido aventureiro, agora acuado contra um muro de lamentações. Por breve instante, Prof. Borges suspira aliviado. Mas o alívio dura pouco: contra a multidão enfurecida vem apenas outra turba descabelada, aos berros: "Lula Livre! Lula Livre! Lula Livre!". Um lovecrafteano molusco se agita numa masmorra, instigado por seus adoradores.
"Quem não comunica, se trumbica!"
Prof. Borges se atira do palco, pouco antes do feroz encontro das duas facções sanguinárias, que se dividem e multiplicam por décadas e séculos afora, em sinistras metástases políticas: queremistas esfaqueiam saquaremas, luzias fuzilam lacerdistas, brizolistas pisoteiam as tripas de udenistas, mulheres marchadeiras esquartejam jovens carapintadas, guerrilheiros torturam milicos, black-blocs devoram tupinambás, tupiniquins arremessam molotovs contra o choque... Imperturbáveis como bacantes alucinadas, as chacretes dançam sempre sorridentes, apesar do mar de sangue que as cobre até os joelhos.
A buzina soa e ressoa freneticamente. Não há intervalo comercial. Os ponteiros do relógio seguem imóveis nessa perpétua tarde de sábado. O Prof. Borges se pergunta quando escapará desse tormento. Como se lesse seus pensamentos, Abelardo Barbosa anuncia lugubremente:
"Só acaba quando termina!"
Dedicado ao amigo Vinicius Borges
Um comentário:
Bravo!
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