Cresci ouvindo meu avô e minha avó contando anedotas, episódios e casos dos mais variados tipos, desde situações cômicas a histórias tristes. Relatos de amores proibidos, guerras e revoltas, tesouros escondidos e assombrações. Enfim, fui educado numa tradição oral quase "tribal", sempre realimentada nas conversas familiares. Com toda certeza, essa vivência teve grande relevância em minha inclinação ao culto de Clio. Pretendo agora compartilhar com meus amigos esses tesouros de família...
Duas narrativas que me fascinaram quando criança foram as histórias de "fantasmas" contadas por meu avô, Waldo. Ele nasceu em Laguna, Santa Catarina, em 1925, e teve uma infância muito pitoresca. Ele contava que durante anos, em sua meninice, um cemitério da cidade fôra considerado mal assombrado... à noite as pessoas viam de longe luzes estranhas aparecendo sobre o campo santo... Não é necessário dizer que essas "aparições" provocavam medo em muitos. Até que em meados da década de 1930 andou por lá um cientista vindo da Alemanha, pesquisando alguma coisa na região (não sei exatamente o quê...). Quando soube da história, ele logo concluiu do que se tratava: fogo-fátuo, um fênômeno natural comum em lugares onde há corpos em decomposição, como brejos, pântanos ou cemitérios. A putrefação libera gase como fosfina (PH3) e metano (CH4), que entram em combustão ao contato com o oxigênio do ar. Aliás, as interpretações sobrenaturais sobre o fogo-fátuo abundam em diversas culturas da América, Europa e África. Até em Laguna... O episódio impressionou vivamente a meu avô, que o lembraria para o resto da vida. Posso imaginar a decepção que a explicação deve ter provocado em muitos habitantes da cidades, enquanto outros lagunenses devem ter permanecido céticos em relação à solução científica do fenômeno... Por sinal, me parece um episódio muito ilustrativo daquilo que Weber denominou Weltentsauberung, o famoso "desencantamento do mundo".
Outra história interessante e engraçada se passou anos mais tarde, por volta de 1942. Nessa época meu avô estudava na Escola de Grumetes, atual Colégio Naval, em Angra dos Reis. Muitos jovens grumetes estavam então impressionados com as frequentes aparições de um errante vulto branco sobre um morro próximo dos alojamentos. Obviamente, muitos pensavam que era um fantasma. Um corajoso sargento resolveu então desvendar o mistério. Munido de um revólver e um pedaço de pau subiu no morro e ficou à espreita, aguardando a aparição... Quando a assombração finalmente surgiu, o sargento saiu de seu esconderijo ao encontro do espectro, gritando: "Se for fantasma é tiro, se for homem é paulada!" O fantasma logo respondeu, apavorado: "Sou gente, sou gente!", tirando o lençol que o encobria. Era um dos grumetes, metido a engraçado, que saía escondido para assustar os colegas. Imagino que tenha se divertido bastante ao ouvir os relatos dos camaradas. Pobres rapazes, o verdadeiro fantasma que iriam enfrentar era a II Guerra Mundial! Mas essa é outra história...
O tradicional relógio dos Tavares!
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