Essa semana, ouvindo o primeiro livro de Prelúdios de Débussy, me veio a vívida recordação de um dos momentos mais felizes da minha vida.
Era setembro ou outubro de 2001. Por apenas R$ 15,00 comprei entradas para um recital de piano no foyer do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Execução integral do primeiro livro de Prelúdios: La fille aux cheveux de lin, Des pas sur la neige, Ce qu`a vu le vent d`ouest, Les collines d`Anacapri, La sérénade interrompue etc. Não lembro quem era o pianista (só caçando o programa no meio da minha bagunça), mas era excelente, daqueles que não apenas executa, mas interpreta.
Era um fim de tarde primaveril. A luz crepuscular atravessava os vitrais do foyer, compondo uma espectral penumbra luminosa. Uma catedral profana. As peças seguiam, me transportando para todos aqueles lugares mágicos sonhados por Débussy. Um desses momentos estranhos em que todos os detalhes casuais parecem delicadamente arranjados.
Me sentia ligeiramente sonolento, entregue, no sentido mais profundo, à fruição da música. Uma experiência única de êxtase contemplativo. O tipo de experiência tão única que não se repete outra vez na vida. Nunca. O gênero de vivência cuja descrição será sempre superficial, e cujo significado profundo será sempre impossível de comunicar. Algo que transcende a expressividade dos poemas, a eloquência das imagens e mesmo, paradoxalmente, o próprio êxtase musical. Naquele dia, eu escutava algo além da música, algo que transcendia e atravessava o próprio Débussy que compusera aquelas peças....
Nenhuma outra execução dos Prelúdios, em qualquer outra luz crepuscular, fosse mesmo um lindo crepúsculo veneziano, me levaria da mesma maneira ao encontro da moça de cabelos de linho, sentir aquele cansaço de um andarilho na neve ou a força arrebatadora do vento do oeste.
Tudo isso por R$ 15,00...
sábado, 19 de setembro de 2015
O paraíso por R$ 15,00
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