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terça-feira, 30 de junho de 2020

segunda-feira, 29 de junho de 2020

Chaves, Café e Erotismo


No primoroso livro "O diário do Chaves", Roberto Goméz-Bolaños faz insinuações bem sugestivas sobre as famosas "xícaras de café" na casa 14 da vila. O menino Chaves, narrando em primeira pessoa, se pergunta ingenuamente o que Prof. Girafales e Dona Florinda passavam tanto tempo fazendo sozinhos lá dentro. 

No próprio seriado há um episódio em que o  Professor entra na casa de Dona Florinda e logo manda Quico desligar a TV e ir brincar na vila. O garoto protesta, mas a mãe diz que ela e Girafales precisavam "descansar"...

Eu era adulto quando li "O diário do Chaves" e confesso que fiquei um tanto... abalado. Especialmente porque a obra é do próprio Bolaños, então parece que a coisa sempre foi proposital, mais que uma insinuação tardia. Talvez uma piada para os adultos, inclusive porque no México não era um programa propriamente infantil; era transmitido pela Televisa para uma audiência ampla, nas noites de sábado. 

Chaves e Chapolim foram televisionados como programas "infantis" no Brasil, por opção do SBT. No entanto, inúmeros episódios possuem insinuações de caráter sexual, geralmente sutis. Há discretas referências a pornografia (as tais revistas do Seu Madruga), homossexualidade (especialmente no episódio em que vários personagens suspeitam de envolvimento homoerotico entre Seu Madruga e Prof. Girafales) e até a sadomasoquismo (o beliscão acidental de Prof. Girafales na "Bruxa do 71").

Minha geração era criança e cresceu vendo tudo com o mesmo olhar inocente. Mas imaginar que enquanto as coisas se passavam no pátio da vila havia gente (figurativamente) "haciendo amor" nos bastidores... Perturbador.

Nos choca perceber tardiamente que a relação entre Girafales e Florinda fosse além dos platônicos buquês de flores e xícaras de café...

quinta-feira, 25 de junho de 2020

O fluir e refluir do tempo

"This past [...] stretching all the way back to its origin, instead of pulling us back, pushes us forward, meaning that, contrary to what might be expected, it is the future that propels us back into the past."
Hannah Arendt

quarta-feira, 24 de junho de 2020

Getúlio Vargas e o Brasil na II Guerra Mundial

Extratos do livro Uma História do Brasil, de Thomas Skidmore

Em torno de 1934, o tipo de confronto geopolítico europeu já estava se tornando claro. A Alemanha nazista tinha seus olhos não apenas em seus vizinhos europeus, mas também sobre a crescente influência no Hemisfério Ocidental. Ela identificava o Brasil como um importante parceiro comercial e começava a exercer influência sobre essa relação bilateral, por meio de um mecanismo que consistia numa moeda alemã especial usada para pagar pelas exportações brasileiras, que podia ser resgatada apenas pela compra de exportações alemãs, criando uma forma de comércio amarrado. [...] Entretanto, os alemães estavam interessados em mais do que comércio. Eles também queriam atrair o Brasil para a sua esfera político-militar, e cultivavam sistematicamente a amizade com oficiais do Exército brasileiro, conhecidos como admiradores da destreza militar alemã, bem como ofereciam ao Brasil armas e treinamento técnico. Do mesmo modo que no período pré-Primeira Guerra Mundial, o governo dos EUA preocupava-se com essa estratégia alemã, tendo o Departamento de Estado denunciado a política comercial alemã como discriminatória. Os militares americanos tentaram agir contra as ofertas alemãs de armas e treinamento, mas fracassaram neste esforço. Getúlio havia tentado obter equipamento militar americano antes, mas o Congresso dos EUA, um corpo bastante isolacionista durante a década de 1930, proibira a venda de armas no exterior pelos Estados Unidos.

[...]

A opinião pública brasileira era o alvo em uma batalha sobre que lado apoiar na guerra que se aproximava na Europa. O sentimento da elite favorecia fortemente os Aliados por razões culturais, e, até sua supressão em 1935, os comunistas também haviam sido eficazes em promover opiniões antinazistas. Mas alguns brasileiros, como em 1914, eram favoráveis à Alemanha, não obstante os laços culturais históricos.

Getúlio mostrava-se inclinado a procurar os Estados Unidos para laços militares, tentando, como já citamos, comprar armas deles antes de se voltar para a Alemanha. Em 1937 ele também oferecera ao presidente Roosevelt o uso de bases litorâneas no Brasil, oferta esta que foi recusada, presumivelmente porque Roosevelt não podia permitir-se contrariar o Congresso isolacionista, dando a impressão que se preparava para a guerra. E uma oferta brasileira de comprar destroieres excedentes dos EUA foi igualmente recusada quando as autoridades americanas cederam aos protestos da Argentina contra a venda. Quando a guerra finalmente eclodiu em 1939, Getúlio e seus generais, lembrando essas rejeições, preferiram permanecer neutros até que os Estados Unidos estivessem preparados para pagar um preço justo pelo apoio brasileiro. Além disso, os brasileiros continuavam a cultivar relações com as potências do Eixo como parte do jogo de usá-las contra os Estados Unidos.

O Brasil não declarou guerra até meados de 1942, quando os que estavam em cima do muro puderam ver que a sorte militar havia virado para o lados dos Aliados. A invasão da Rússia em 1941 havia apanhado a Wermacht em um feroz inverno russo, e os submarinos alemães sofriam pesadas perdas na batalha do Atlântico. O Brasil não podia esperar mais se pretendia obter alguma compensação atraente por entrar na guerra.

O Brasil tinha ao menos dois trunfos de que os Aliados precisavam. Um era matéria-prima, incluindo borracha natural, quartzo (essencial para comunicações por rádio) e outros minerais. O outro era seu litoral, que oferecia bases aéreas e marítimas em pontos estratégicos no Oceano Atlântico. Getúlio conseguiu um acordo atraente, pelo qual o país concordava em fornecer a matéria-prima e as bases aos EUA, apenas em troca de equipamento militar, assistência técnica e financiamento para uma usina siderúrgica brasileira (localizada em Volta Redonda). Essa aliança fez do Brasil o mais evidente parceiro latino-americano dos Estados Unidos na guerra. Além disso, estabelecia precedente para o apoio do governo americano à industrialização de base em um país do Terceiro Mundo.

Em 1941 Getúlio começou a mover-se em direção aos Aliados ao aprovar um projeto da Pan American Airways (sob contrato do exército dos EUA) para modernizar aeroportos no Norte e Nordeste. Em janeiro de 1942, na conferência do Rio de Janeiro, onde o apoio latino-americano para a entrada na guerra agora prevalecia, graças ao ataque japonês a Pearl Harbor, o Brasil rompeu ostensivamente com o Eixo. O ingresso do Brasil na guerra tinha uma importante implicação para a política interna. A decisão de unir-se às democracias era um golpe contra os autoritaristas que alegavam que a democracia não tinha lugar no Brasil, e supunham que Getúlio concordava com eles. Este e seus generais, ao questionarem essa suposição, estavam montando o cenário para um debate que iria terminar com o fim da ditadura getulista.

Com a entrada do Brasil na guerra, uma onda de funcionários norte-americanos, tanto militares como civis, veio ao Brasil. [...] Em 1943, brasileiros e norte-americanos construíram uma rede de modernas bases militares aéreas e marítimas no litoral do Nordeste.

Junto com a ofensiva militar dos EUA no Brasil veio uma ofensiva cultural. O presidente Roosevelt designou o multimilionário Nelson Rockefeller para dirigir um novo escritório cujo objetivo era promover a melhoria das relações culturais com a América Latina, tendo o Brasil como alvo principal. O escritório de Rockefeller recrutou talentos como Orson Welles e Walt Disney para fazerem filmes voltados ao fortalecimento da opinião pró-EUA.

[...]

Por trás dessas atividades jaziam objetivos d elongo prazo dos EUA: sendo um deles o aumento de sua penetração econômica no país. Embora o investimento norte-americano no Brasil já superasse o investimento britânico, investidores norte-americanos ansiavam por novos progressos. [...] A colaboração durante a guerra oferecia uma base excelente para a ofensiva econômica norte-americana posterior. Aviões norte-americanos passaram a dominar não apenas o uso militar, mas também o civil.

[...]

O desejo de Getúlio de identificar o Brasil com a causa dos Aliados levou-o a oferecer três divisões do Exército brasileiro, cujos oficiais se entusiasmaram com a ideia, para combater os alemães no cenário de guerra do Mediterrâneo. Getúlio tinha dois importantes propósitos ao insistir no papel militar brasileiro: um era enfatizar a posição do Brasil como único país latino-americano a enviar forças terrestres sob sua própria bandeira para a guerra [...]; e o segundo era despertar o orgulho brasileiro e dar ao público uma razão patriótica para apoiar o governo.

Para enfatizar que se tratava de um esforço nacional, Getúlio queria efetivos recrutados por todo o país e insistiu para que todo estado fosse representado, independentemente da qualidade dos recrutas locais. A força resultante era altamente heterogênea, carecendo de treinamento comum e desprovida por completo de experiência de combate. [...] Os comandantes [brasileiros] esperavam combater na África do Norte, portanto as tropas receberam uniformes de verão, mas a Força Expedicionária Brasileira, ou FEB, foi designada para operar com o Quinto Exército dos EUA, que combatia contra a renhida defesa alemã em terrenos montanhosos ao norte de Roma, exatamente quando se iniciava um rigoroso inverno. Os brasileiros foram lançados à batalha com a missão de escalar um precipício no qual os alemães estavam com os canhões em posição dominante. Apanhados no fogo cerrado, sofreram pesadas baixas e retiraram-se desordenadamente.

Embora difícil de surpreender, [...] o fracasso nesse primeiro combate foi extremamente perturbador para os comandantes brasileiros, que recorreram aos norte-americanos para ajuda e orientação. As tropas nacionais passaram por rápido retreinamento e logo retornaram ao combate. Seu desempenho foi significativamente melhor, e eles ajudaram a capturar Monte Cassino, o monastério histórico que assinalava a principal posição alemã. O registro do combate brasileiro na Itália tornou-se ulteriormente objeto de amarga controvérsia: os relatos oficiais enfatizavam o autêntico heroísmo depois do retreinamento, mas os críticos (incluindo alguns oficiais brasileiros) enfatizavam o fracasso inicial pelo qual eles injustamente culpavam comandantes incompetentes.

O engajamento do Brasil no combate deixou um legado significativo. Primeiro, forneceu uma base para a reivindicação do país de um papel importante no pós-guerra [...]. Segundo, o envio da força expedicionária aumentou imensamente o prestígio do Exército brasileiro. Como os únicos latino-americanos a terem lutado na Europa, os brasileiros podiam manter a cabeça erguida entre os Aliados. Terceiro, o combate conjunto na Itália fortaleceu os laços entre os militares norte-americanos e brasileiros, mesmo considerando-se que o Brasil permanecia claramente como o sócio menor.

Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial, Rio de Janeiro

"Um tempo para cada coisa É cada coisa no seu tempo".
Rodrigo Watzl

terça-feira, 23 de junho de 2020

"It is farofa"

Certa vez tive a honra de explicar a um acadêmico estrangeiro como funcionava um self-service a quilo e explicar o que era farofa, num colóquio internacional anterior ao incêndio do Museu Nacional.

"And you can pick ANYTHING and pay just by the weight?".

"Hmmm... Yes".

"And what is that?"

"It is 'farofa'. Some kind of flour made of manioc".

"Wow! Is it good?"

"Well, go and taste yourself".

Ele italiano, eu brasileiro, em inglês respectivamente macarrônico e farofônico.

Que saudades daquele Museu, e daquele restaurante, que parecia ruim, mas era bom...



Metamorfoses cartesianas


"The thought of this idiotic scoundrel reveling in sweet, heroic romanticism is endlessly nauseating."
Thomas Mann, sobre Hitler

"...por vós esperamos"

"Every age has its own fascism, and we see the warning signs wherever the concentration of power denies citizens the possibility and the means of expressing and acting on their own free will. We may come to this in many different ways, not necessarily through the terror of police intimidation, but also by denying and distorting information, by undermining justice, by paralyzing schools, and by spreading in many subtle ways nostalgia for a world where order reigned supreme, and where the security of a privileged few depended on the forced labor and the forced silence of the many".
Primo Levi, A past we thought would never return ([1974] 2002)

"Nothing is more characteristic of the totalitarian movements in general and of the quality of the fame of their leaders in particular than the startling swiftness with which they are forgotten and the startling ease with which they can be replaced".
Hannah Arendt, The origins of totalitarianism (1973)


Reagindo ao naufrágio...

Mais uma pérola anônima da memesfera.

Existe uma "Ditadura do STF"?

Como já me manifestei de outra feita, o Judiciário (e não apenas o STF) é o menos democrático dos poderes (mas não antidemocrático, por óbvio), à medida que a população não tem o menor controle sobre os magistrados, em qualquer instância. Por outro lado, a magistratura exige competências técnicas que tornam inviável que seus membros sejam eleitos por voto popular. A solução que existe em alguns países, segundo jurista amigo meu, é que a magistratura seja rotativa, que juízes, mesmo concursados, em qualquer instância, permaneçam no cargo por períodos de no máximo 5 anos. Tal medida já evita a consolidação da magistratura como casta, como sucede no Brasil e alhures. O recurso amplo a júri popular, ao contrário da prática brasileira, é outra medida que contribui para temperar eventuais abusos de magistrados. Além disso, a eleição de chefes de promotoria, como sucede em alguns lugares, é outra ação capaz de contrabalançar o poder dos magistrados com base na escolha popular.

De resto, a retórica de que há uma "ditadura do STF" é só isso mesmo: retórica, no sentido sofismático do termo. É uma retórica que começou a se fortalecer durante o processo do Mensalão, para mobilizar a militância petista e, como todo sofisma, pode ser facilmente invertido e instrumentalizado por outros. É o que passa no momento corrente. As acusações de que o STF era ditatorial serviram outrora aos interesses do PT e ora servem aos interesses dos Bolsonaro.

A rigor, o único poder que pode efetivamente se tornar ditatorial em qualquer regime republicano é o Executivo, por razões óbvias. Daí o interesse dos mandatários do Executivo, em situações de crise, de acusar o Judiciário de ser "ditatorial" quando a situação não caminha do modo como lhe interessaria.

Por natureza das respectivas competências, o Executivo tende a ser o mais ativo dos poderes, enquanto o Judiciário termina por ser o mais passivo deles. Uma autêntica ditadura do Judiciário chega a ser difícil de imaginar. O Judiciário, em qualquer país, pode ser um cúmplice importante de regimes ditatoriais, mas dificilmente será capaz de instaurar, por si, um regime autoritário.

Por outro lado, o uso e abuso do termo "Poder Moderador" nos últimos meses, em referência às Forças Armadas ou ao STF, beira o ridículo. A própria ideia de um poder moderador, nominal ou funcional, é uma excrescência que não tem lugar em nenhuma república democrática digna do nome. É apenas mais um indício, entre tantos outros, do quão disparatado e delirante o debate político no Brasil se tornou na última década.


domingo, 21 de junho de 2020

Fantásticos mundinhos



Parecem colinas nevadas na Patagônia, mas é apenas o congelador do meu freezer.

Quando eu era criança ficava imaginando que existia um povo "selvagem" vivendo nos buraquinhos da máquina de lavar da minha avó. Meu sonho era encolher para visitá-los. 

Era uma daquelas máquinas antigas, com tampa fechada de aço, então eu ficava imaginando que eles se escondiam quando a gente abria a tampa e saíam quando a gente fechava. Às vezes eu abria a tampa de supetão para flagrá-los. 

A imaginação infantil é uma coisa extraordinária. E minha criança interior segue bem viva, felizmente. 

Talvez por isso eu goste tanto de "Toujours", da cantora Zaz:

J's 'rai toujours la môme des chemins
La meilleure copine des lapins
La petite fille des herbes folles
Qui s'casse la gueule et qui rigole

J's 'rai toujours la môme des fougères
La gamine qui joue dans la terre
La petite fille aux papillons
Qui s'pique aux pics des hérissons

J's 'rai toujours la môme des sauterelles
La bonne copine des coccinelles
La petite fille des chants d'oiseaux
Qui s'cache au milieu des roseaux

J's 'rai toujours la môme qui courait
Dans les champs jusqu'à la forêt
Dans les rangées de tournesols
Qui s'casse la gueule et qui rigole

Au milieu d'une foule compacte
Des bousculades et des carrefours
De la fenêtre de mon appart'
Et à l'horizon des tours

Dans les heures de pointe du métro
Des secousses et des aiguillages
Dans le miroir d'un rétro
Au milieu des embouteillages

Dans le sérieux des opinions
Des arguments et stratégies
D'emploi du temps en réunion
Si c'est de ça qu'il s'agit

Des sacs à refaire mes affaires
De mes bagages enregistrés
Entre les décalages horaires,
De mes départs, mes arrivées

J's 'rai toujours la môme des chemins
La meilleure copine des lapins
La petite fille des herbes folles
Qui s'casse la gueule et qui rigole

J's 'rai toujours la môme des fougères
La gamine qui joue dans la terre
La petite fille aux papillons
Qui s'pique aux pics des hérissons

J's 'rai toujours la môme des sauterelles
La bonne copine des coccinelles
La petite fille des chants d'oiseaux
Qui s'cache au milieu des roseaux

J's 'rai toujours la môme qui courait
Dans les champs jusqu'à la forêt
Dans les rangées de tournesols
Qui s'casse la gueule et qui rigole

Sur les trottoirs d'un autre monde
Au pied des mêmes quartiers d'affaires
Des bouts de couloirs qui se confondent
À la mémoire de mes passages éclairs

De mes chambres d'hôtels trop chics
Des taxis jusqu'aux halls de gares
Des longs tunnels périphériques
Des avenues et des boulevards

Au bord des vertiges et des gratte-ciels
Des rendez vous, des bavardages
Dans les grandes villes, sans l'essentiel
Quand le béton me met en cage

De mes jours à côte de la plaque
Comme étrangère et sans repère
À me réfugier dans les parcs
Pour faire semblant de prendre l'air

J's 'rai toujours la môme des chemins
La meilleure copine des lapins
La petite fille des herbes folles
Qui s'casse la gueule et qui rigole

J's 'rai toujours la môme des fougères
La gamine qui joue dans la terre
La petite fille aux papillons
Qui s'pique aux pics des hérissons

J's 'rai toujours la môme des sauterelles
La bonne copine des coccinelles
La petite fille des chants d'oiseaux
Qui s'cache au milieu des roseaux

J's 'rai toujours la môme qui courait
Dans les champs jusqu'à la forêt
Dans les rangées de tournesols
Qui s'casse la gueule et qui rigole

J's 'rai toujours la môme des chemins
La meilleure copine des lapins
La petite fille des herbes folles
Qui s'casse la gueule et qui rigole

Babel Carioca - Reflexão uerjiana

Dedicado à amiga Ana Delmas

A UERJ, como um todo, é uma comunidade universitária fascinante. Uma verdadeira Torre de Babel. Acho que é um exemplo notável do como a arquitetura influencia nossas interações sociais. E a arquitetura da UERJ favorece todo tipo de interação bizarra e pitoresca. Cada andar daquele prédio é um microcosmos e o modo como esses microcosmos interagem é algo fascinante. 

O próprio fato do edifico ter abrigado a "Favela do Esqueleto" já é digno de nota. Que outra universidade no mundo já foi uma favela? A favela transformada em universidade "na marra" (e botando os favelados para correr) é quase alegórico.

Sem mencionar o conjunto urbano UERJ-Mangueira-Maracanã. Esse triângulo universidade-favela-estádio, mediado por Radial Oeste, ferrovia e "metrovia" é digno de nota. Tudo isso pertinho da Quinta da Boa-Vista, antiga residência imperial, diga-se de passagem.

Acho que a UERJ é o mais próximo que existe no mundo real de uma paisagem escheriana.

Dava uma tese.




sexta-feira, 19 de junho de 2020

Seria o Brasil o maior clube sadomasô do mundo?!

Eu NÃO sou um "Comunista Libertário"!!!

Só rindo desse tipo de testes

"Comunista Libertário" é um rótulo que, DEFINITIVAMENTE, eu não aplicaria a minha pessoa! 

No tal "Eixo Econômico" eu diria que sou a favor de uma economia de mercado com regulamentação rígida em setores essenciais e estratégicos e bastante livre em outras áreas, acompanhada de tributação progressiva e direitos trabalhistas sólidos. 

No "Eixo Diplomático", eu diria que minha tendência é o equilíbrio entre a soberania nacional e cooperação internacional multilateral, tanto a nível regional quanto global. 

No "Eixo Civil", tendo a ficar com a máxima rousseauniana de que "minha liberdade acaba onde começa a do próximo" e que as autoridades devem atuar como mediadoras de conflitos, ao mesmo tempo que constantemente questionadas, com recurso à desobediência civil não-violenta sempre que necessário. Como Juvenal, sempre desconfio de autoridades e lideranças: "Quid custodiet ipsos custodes?"

No tal "Eixo Social", eu diria que sou favorável a mudanças construtivas, desde que realizadas com a devida prudência, sem apego excessivo ao passado, nem entusiasmo delirante quanto ao futuro. 

Ou, como prefiro dizer, um tanto platonicamente, "meu cérebro é socialista, meu coração é anarquista, meu estômago é liberal e meu bolso é conservador"! Sou um sujeito eclético, que gosta de democracia, diálogo e dialética, por mais difíceis que sejam essas artes. De qualquer modo, recomendo a realização do teste; apesar de todas as limitações, é uma provocação "boa para pensar". 

No fundo, acho que sou algo como um "Jacobino Não-Violento"...

Liberté, égalité, fraternité! Encore et toujours! Vive la République!


quinta-feira, 18 de junho de 2020

Conselhos para bem viver


 Carta do Reverendo Sidney Smith*
para Lady Georgiana Morpeth em 16 de fevereiro de 1820

1.              Viva tão bem e beba tanto vinho quanto conseguir ousar;
2.              Tome banho com pequena quantidade de água, em temperatura baixa o suficiente para dar uma leve sensação de frio: 21 a 25° C;
3.              Livros, os que divirtam;
4.              No curto prazo, não pense além da hora da janta ou do chá;
5.              Mantenha-se tão ocupado quanto possível;
6.              Encontre-se sempre que possível com aqueles amigos que o respeitam & gostam de você;
7.              E com aqueles conhecidos capazes de distraí-lo;
8.              Abra-se com seus amigos e não guarde para si pensamentos tristes: disfarçá-los por dignidade agrava sempre a situação;
9.              Preste atenção aos efeitos que chá e café têm sobre você;
10.          Compare sua situação com a de outras pessoas;
11.          Não espere muito da vida humana, um negócio lamentável, na melhor das hipóteses;
12.          Evite poesia, representações dramáticas (exceto comédia), música, romances sérios, pessoas melancólicas e sentimentais e tudo o que possa suscitar sentimento ou emoção que não resulte em atos de efetiva bondade;
13.          Faça o bem e se esforce para agradar às pessoas de todas as condições;
14.          Fique ao ar livre o máximo que puder, desde que sem cansaço;
15.          Faça do ambiente onde gosta de sentar-se lugar agradável e alegre;
16.          Lute, aos pouquinhos, contra a inatividade;
17.          Não seja severo demais consigo mesmo, nem se subestime, mas faça justiça a si proprio;
18.          Conserve a chama da lareira sempre acesa;
19.          Seja firme e constante no exercício da religião racional;
20.          Acredite em mim.

*    Viveu de 1771 a 1845. Em fevereiro de 1820, Smith tinha 48 anos e vivia, com a família, numa região rural, em Yorkshire, a 320 km tanto de Londres quanto de Edimburgo, onde ele se sentia à vontade intelectual e socialmente. Havia sido um dos fundadores da Edinburgh Review, um das grandes revistas da época, e, em Londres, era conhecido por suas palestras espirituosas. Não se encontrava em algum exílio, mas estava obrigado a fazê-lo como pároco da Igreja anglicana.
Texto e informações extraídas do artigo de Verlyn Klinkenborg no The New York Review of Books Daily, 14 de maio de 2020. Trad. de Diana Prado Valadares e Guilherme Pereira das Neves.


Original:

1.     Live as well and drink as much wine as you dare.
2.     Go into the Shower bath—with a small quantity of water at a temperature low enough to give you a slight sensation of cold—75 or 80°.
3.     Amusing books.
4.     Short views of human life not farther than dinner or Tea.
5.     Be as busy as you can.
6.     See as much as you can of those friends who respect, & like you.
7.     And of those acquaintance who amuse you.
8.     Make no secret about Low Spirits to your friends but talk of them fully—they are always worse for dignified Concealment.
9.     Attend to the effects Tea and Coffee produce upon you.
10.   Compare your Lot with that of other people.
11.   Don’t expect too much from human life, a sorry business at the best.
12.   Avoid poetry, dramatic representations (except Comedy), Music, serious novels, melancholy sentimental people, and every thing likely to excite feeling or emotion not ending in active benevolence.
13.   Do good, & endeavor to please every body of every degree.
14.   Be as much as you can in the open air without fatigue.
15.   Make the room where you commonly sit gay & pleasant.
16.   Struggle by little and little against idleness.
17.   Don’t be too severe upon yourself, or underrate yourself —but do yourself Justice. 18.  Keep good blazing fires.
19.   Be firm and constant in the exercise of rational religion.
20.   Believe me


A cup of tea with Monsieur Renoir...

quarta-feira, 17 de junho de 2020

Línguas, Livros, Caminhadas e Travessias

Nos últimos dias empreendi uma empolgante travessia: pela primeira vez li, de capa a capa, um livro inteiro em Alemão, 270 páginas, uma de cada vez.

Não li como quem caminha sobre uma ponte, mas como quem atravessa um rio com água até os joelhos.

O livro, obviamente era "Krabat", de Ottfried Preußler, uma de minhas obras favoritas de fantasia, que descobri quase por acaso, na Bienal de 2007, num balcão de livros encalhados.

Ainda no ônibus, retornando para casa, abri o livro e o devorei em menos de 48 horas. Assim é a prosa de Preußler. Nos anos seguintes li "Krabat" mais duas vezes, ainda na língua de Camões.

Em 2012, quando Priscila e eu partimos para nosso inesquecível verão europeu, um de meus objetivos era trazer para casa um exemplar de "Krabat" na língua original.

Iniciei minha busca desde o primeiro passo em solo germanófono, na insossa Zurique, provavelmente a cidade mais prosaica, chata e pequeno-burguesa do mundo. Em Zurique avistei quantidade de carros de alto luxo como em nenhum outro lugar, mas as livrarias eram escassas, e não havia exemplar de "Krabat"em nenhuma delas, para minha grande decepção.

Felizmente Zurique (onde jamais pretendo zurückgehen) era apenas uma escala. Dali tomamos um trem noturno para Viena com seus mil encantos. Assim que descemos na Hauptbahnhof e tomamos nosso Frühstück, procuramos a livraria da estação. Em meu sempre claudicante alemão, me dirigi à balconista:

"Guten Morgen! Haben Sie 'Krabat', bitte?"

A moça arregalou seus olhos azuis:

"'Krabat'?! Von Preußler?!"

Me senti como quem perguntasse se havia pão na padaria. Retruquei:

"Ja. 'Krabat', von Ottfried Preußler. Haben Sie es...?!"

"Natürlich!"

Sem delongas, a moça atravessou a livraria na diagonal e em poucos segundos eu tinha a relíquia em minhas mãos, como um Parsifal que houvesse encontrado seu Santo Graal:

"Danke schön! Ich liebe 'Krabat'!"

Meu Alemão era insuficiente para expressar adequadamente minha gratidão, mas imagino que o sorriso tenha sido mais que expressivo. A moça sorriu de volta, com uma longa frase, da qual pouco entendi.

Meses depois, de volta ao Brasil, finalmente tomei meu exemplar germânico de "Krabat" para, supostamente, me deleitar com a prosa de preußleriana original. Em vão. Após muitas consultas ao dicionário e à tradução brasileira, desisti da tarefa que se revelou ingrata.

Com imensa frustração entreguei "Krabat, von Preußler" a uma prateleira. Havia viajado meio mundo atrás daquele livro, mas agora que o tinha em minhas mãos, não conseguia juntar as palavras, frases, parágrafos e páginas para fazer um romance. Eu enxergava as árvores, mas a floresta escapava a meus olhos. Me senti como um Parsifal que houvesse encontrado o Santo Graal, mas permanecesse incapaz de contempla-lo em sua ofuscante luminosidade.

Sempre tive facilidade para aprender línguas - a começar pela Portuguesa. Dizem meus familiares que comecei a falar com espantosa fluência com menos de um ano de idade. Alfabetizado, logo comecei a buscar livros cada vez maiores. Aos sete anos encasquetei de ler os dois imensos volumes de "Moby Dick" que tínhamos em casa: "Chamei-me Ismael". Naufraguei como os tripulantes do Pequod; pior, parei no meio do caminho para Nantucket, antes mesmo de embarcar rumo à trágica aventura.

Como Acab, fiquei obcecado por abater Moby Dick - o livro, não o cachalote. Pouco mais tarde, com 13 anos, fortalecido pelas jornadas no Mississipi ao lado de Tom Sawyer, Huckleberry Finn e Mark Twain e por outras aventuras com Emília, Narizinho, Pedrinho e Monteiro Lobato, finalmente resolvi minha velha rixa com Melville e seu temível cachalote branco. Conheci Queequeg, embarquei no Pequod, atravessei o Cabo Horn, e sobrevivi ao naufrágio com Ismael, agarrado a um caixão. Era um livro denso para um leitor imaturo. Ainda assim, impressionante. É um clássico ao qual ainda preciso retornar (agora, na língua original).

Alfabetizado em Português, outros horizontes linguísticos me acenavam. Em criança, um de meus livros favoritos era "O Pato Poliglota" - e eu sonhava em ser como aquele pato! Me encantavam os recuerdos em diversas línguas, colecionados por meu avô em seus tempos de marinheiro globe-trotter.

Na escola primária, "aulinhas" de Inglês. No cinema e nos VHSs eu tentava (com pouco sucesso) encontrar correlações entre as legendas e as falas dos filmes. Com Collor, Itamar e FHC nosso mercado foi se abrindo cada vez mais às importações e chegavam a minhas mãos produtos com rótulos e manuais de instruções em várias línguas (era no tempo em que manuais de instruções eram longos, minuciosos e impressos; altre tempi). Às vezes passava horas e horas debruçado sobre essas preciosidases. Eram minhas pedrinhas de roseta; minha avó caçoava de meus rudimentares exercícios de linguística comparativa, mas é uma mania que ainda hoje me acompanha.

Logo mais chegavam ao Brasil os caríssimos "trading cards" de super-herois - um pequeno luxo que minha suburbana família de classe média baixa podia me conceder de vez em quando. Avidamente colecionados, me proporcionaram duradoura experiência com a língua de Shakespeare. Lia e relia os cartõezinhos coloridos como um dedicado epigrafista, acompanhado de um pesado dicionário Inglês-Português. Certa vez meu avô cometeu a insensatez, duramente censurada por minha mãe, de me satisfazer o capricho de comprar um gibi importado do Batman por R$ 40,00 - quase meio salário mínimo à época...! Os games e, mais tarde, os livros, completaram minha introdução à anglofonia. "Treasure Island", de Robert Louis Stevenson foi o primeiro livro que li em inglês (em barata edição da "Penguin Classics", must be said).

Entrei no Colégio Pedro II no tempo em que os ginasianos tinham o luxo de ter aulas de Inglês, Francês e Latim. Je suis tombé follement amoureux de la langue française. Aos 13 anos, enquanto lia Moby Dick, ingressei na Aliança Francesa, cujas mensalidades minha mãe pagava com algum aperto (mesmo depois que meu bom desempenho me garantiu um desconto de 40% nas mensalidades). Foi nessa época que descobri a Livraria Leonardo Da Vinci  (a autêntica). Com o real valorizado e o franco não-tanto, iniciei uma vasta coleção de Astérix e, mais importante, completei minha coleção das aventuras de Tintin et Milou. Logo descobri as aventuras de Arsène Lupin, que devorei na Mediateca da Maison de France.

O portunhol falamos todos de berço, e me iniciei na língua de Cervantes e Bolaños com "El Lazarillo de Tormes". Com um bom dicionário, me viro na língua do Lácio e adquiri alguma fluência na língua de Dante acompanhando o Giro d'Italia pela Internet, na Gazzetta dello Sport, especialmente o fabuloso Giro de 2004, com a inesperada conquista da Maglia Rosa pelo "Piccolo Principe" Damiano Cunego - mesmo ano da epopeia de Thomas Voeckler no Tour de France, que durante várias etapas se agarrou heroicamente ao Maillot Jaune tomado na lendária Trouée d'Arenberg.

Português, Francês, Inglês, Espanhol, Italiano e um pouco de Latim. Mas o desafio maior, a montanha mais alta, o castelo mais inexpugnável, resistia, e resiste ainda, a minhas investidas: o Alemão.

Tinha meus 15 anos quando me caiu entre as mãos um CD da "Paixão segundo João", de ninguém menos que Johann Sebastian Bach, devidamente acompanhado por um encarte bilíngue, em Alemão e Francês - era no tempo em que CDs vinham acompanhados de robustos encartes - vergangenen Zeiten. Tomei a temerária decisão de aprender Alemão fazendo uma xerox do dito encarte. Mais fácil planejar que fazer - faltou combinar com os alemães! Um recuo estratégico se fez necessário.

Anos mais tarde, em 2003, um maduro cavalheiro em seus 20 anos e graduando em História (nada mais arrogante que um graduando), resolvi empreender meu ataque definitivo contra Deutschenschloss. Munido de dicionários, um livreco de conversação para viajantes e uma pasta repleta de textos impressos da Internet, comecei a estudar Alemão com alguma seriedade e muita irregularidade.

Após alguns anos de inconstantes esforços, conseguia ao menos ler gibis em Alemão - retornando de Veneza, inclusive, passei uma agradável manhã na estação de Munique, lendo gibis (uma chuva torrencial desencorajava qualquer tentativa de passeio). Em Munique embarcamos em um trem da Deutsche Bahn que, por dentro, parecia um cenário de Star Wars; em Düsseldorf tomamos um trem da SNCF onde degustei o couscous marroquino mais saboroso de que me lembro. Só chegamos em Paris à noite, cansados, sedentos e famintos, devido a um terrível acidente ferroviário que nos reteve por horas, esgotando todo o estoque da lanchonete - quase como a bande dessinée "Le Transperceneige", exceto pela antropofagia. Tudo isso com "Krabat, von Preußler" na bagagem.

Em 2013 (re)comecei a estudar Alemão usando o excelente e gratuito aplicativo Duolingo, mas uma série de compromissos acadêmicos e problemas familiares me impediram de manter a disciplina adequada.

Iniciei 2020 firmemente decidido ao assalto definitivo contra Deutschenschloss. Estava determinado a ler em Alemão com desenvoltura até dezembro. Das oder nichts! E assim tenho feito, estudando Alemão quase diariamente, mit mein ganzen Herz.

Há alguns dias terminei de ler "Soie", tradução francesa de "Seta", de Alessandro Baricco, um delírio elsevírico magistralmente ilustrado pela maravilhosa Rébecca Dautremer, com capa artesanal impressa "a quente" num ateliê parisiense, diagramação impecável, papel de textura indescritível, impresso e encadernado numa seleta tipografia de Barcelona.

Ainda aturdido por semelhante fantasia editorial, lida em duas madrugadas, me pus a percorrer minhas estantes em busca de nova leitura.

Foi então que Krabat me chamou.

Timidamente peguei o livro. Ist mein Kraft jetzt genug? Findo o primeiro capítulo, me senti confiante, prosseguindo, com uma ou outra dificuldade, através das 270 páginas, sem recorrer a nenhum dicionário. Wunderschön! Dreimal Hurrah!

Ler "Krabat" em Alemão, apreciando a prosa de Preußler até em sua poética descrição dos tons de verde da grama primaveril foi a realização de um sonho.

Uma breve travessia, após uma longa, exaustiva e, por vezes, desanimadora caminhada. Dezessete anos de esforços foram necessários para ler estas 270 páginas. Mas esta foi apenas uma etapa de uma longa jornada, que espero prosseguir em outros anos e outras páginas.

Finalmente penetrei nos jardins de Deutschenschloss. Ainda há muitos recantos a explorar nesse castelo...


Vivemos no mundo ou é o mundo que vive em nós?

terça-feira, 16 de junho de 2020

Wanderlust is not tourism.

Le repos du chien - Matin d'Automne


A-KI-RA e AGOSTINHO



A-KI-RA. 

Um dos melhores mangás de todos os tempos, criado por Otomo Katsuhiro Sensei e considerado uma das obras fundadoras da estética cyberpunk. Sua adaptação cinematográfica contribuiu muito para a disseminação da cultura pop japonesa no Ocidente. 

A-GOS-TI-NHO, por sua vez, é um personagem vivido pelo ator e humorista brasileiro Pedro Cardoso no remake do seriado cômico "A Grande Família", realizado pela Rede Globo, um dos maiores conglomerados de telecomunicações da América Latina e do planeta Terra. O seriado "A Grande Família" encontrou bastante sucesso, sendo prolongado por várias temporadas. 

Um de seus protagonistas é o mencionado AGOSTINHO Carrara, taxista suburbano, de caracterização picaresca como um típico "malandro", termo da Língua Portuguesa bastante usado na região do Rio de Janeiro e adjacências para identificar pessoas com tendência a resolver problemas do cotidiano de maneira informal e, ocasionalmente, às margens do ordenamento jurídico da República Federativa do Brasil. 

Seriados são uma forma de entretenimento comum entre os primatas da subespécie Homo sapiens sapiens, que atualmente exerce sua efêmera hegemonia sobre a biosfera terrestre, correntemente ameaçada pelo vírus identificado pelos ditos primatas como "COVID-19", embora alguns dentre os mencionados primatas considerem que o fármaco denominado Hidroxicloroquina seja mais que suficiente para conter o surto do vírus supracitado (crença esta desprovida de crédito entre a seleta coletividade de primatas autoidentificada como "comunidade científica"). 

Note-se que a pandemia de COVID-19 eclodiu no ano de 2020, impedindo a realização dos Jogos Olímpicos de Tóquio, de maneira semelhante àquela retratada no mangá AKIRA, que prefigurava com décadas de antecedência a programação dos ditos Jogos Olímpicos para o exato ano de 2020, sendo sua realização impedida por um cataclisma (a saber, "o despertar de Akira"), o que pode levar a crer que Otomo, além de ser um dos mais talentosos mangakás da história também teria algum tipo de habilidade precognitiva como aquelas ostentadas pelos próprios personagens paranormais do dito mangá. 

Este longo texto, escrito em avançada hora, sugere que seu autor, acometido de otite, se encontra fatigado por suas penosas tarefas de docência a distância, sonolento e um tanto delirante.


segunda-feira, 15 de junho de 2020

"Cocô de índio petrificado" - Um emblema

Quando mais um museu brasileiro pega fogo, é oportuno lembrar a mais que emblemática fala do Sr. Jair Messias Bolsonaro reclamando que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional "atrasa obras" por causa de qualquer "cocô de índio petrificado", como se a missão do IPHAN, instituição quase centenária, que teve Mário de Andrade como um de seus fundadores, fosse acelerar obras, e não zelar pelo patrimônio cultural do povo brasileiro.

Em que pese a característica prosa do atual presidente e guardadas as devidas nuances, a fala é fiel retrato do modo como pensamos, enquanto coletividade. 

Há alguns anos lembro de um blogueiro petista que reclamava do atraso de uma obra do apressado "Programa de Aceleração do Crescimento", que andava atrasada devido à presença de uma comunidade de anfíbios ameaçados de extinção no futuro canteiro de obras. Segundo o digníssimo publicista, seria um exagero de regulamentação ambiental - concluía que, entre tantas espécies brasileiras de batráquios, uma a mais ou a menos faria pouca diferença. Por que se preocupar com biodiversidade quando precisamos construir um viaduto?

Assim segue o Brasil: para que se "acelere" o suposto "crescimento", um sapo a mais ou um museu a menos pouca diferença podem fazer.

O povo brasileiro corre sempre, sem saber muito bem para onde ou para quê. Correr, aos trancos e barrancos, tropeços e trambolhões, é o que nos basta. Que se destrua o "cocô de índio" - e até o índio, principalmente o índio - se necessário for.

Seguimos sempre em crescimento acelerado, seja para construir Belo Monte ou para escalar a curva pandêmica. "O Brasil não pode parar".

Como dizia um velho slogan, "esse é um país que vai pra frente" - e pouco se importa com o que deixa para trás...

"Après nous, le déluge" - Luís XIV bem merecia ser brasileiro.

Urnas funerárias amazônicas - mas há quem confunda patrimônio arqueológico com fezes...

O Brasil segue em chamas

Hoje houve um incêndio de graves proporções no Museu de História Natural da Universidade Federal de Minas Gerais.

Mais perdas irreparáveis de nosso inestimável e inestimado patrimônio paleontológico, arqueológico, etnográfico, botânico, zoológico...

Do pouco que temos, é triste que percamos sempre tanto. Perdemos até o que nem imaginávamos que tínhamos.

Sonhamos baixo e nos contentamos com pouco. Qualquer migalha nos satisfaz.

Para usar o velho ditado, somos como burros contemplando palácios. Pior: somos burros incendiando palácios.

Sempre zelosos com o efêmero, seguimos consumindo o que deveria ser duradouro.

Choramos quando uma catedral arde em Paris, mas pouco nos importa que arda (mais) um museu em nosso próprio solo.

Caminhamos a passos largos para vencer o campeonato mundial da pandemia e dos pandemônios.

Seria fácil, fácil demais, culpar este governo, os anteriores ou os próximos - pois novas perdas, infelizmente, hão de vir.

Somos um povo que se construiu marcando peles a ferro quente. Fogo, brasas e fumaça são nossa herança, nossa sina, nossa marca.

Em muitos sentidos, sentidos demais, literais e figurados, imbricados e superpostos, o Brasil se posiciona na vanguarda da triste arte da ocultação de cadáveres.

Queimar e cremar...

Cremar e queimar...

Passado, presente, futuro: carvão, fuligem, cinzas.

Noite ou dia, o fogo nunca se apaga.


quarta-feira, 10 de junho de 2020

Super-heróis: a verdade

"Os designers de moda sempre foram fascinados com a ideia de como as roupas podem transformar o corpo de uma pessoa, e ainda seu caráter ao mesmo tempo. Na ficção, essa metamorfose faz parte do universo dos super-heróis, onde um personagem simboliza o desejo do homem de ir além dos limites mortais. Neste contexto, a capacidade de realização do super-herói é sempre expressa na mudança de seu traje".
Giorgio Armani

"Super-heróis são de propriedade de grandes corporações. São entidades puramente comerciais; eles são feitos para dar um dinheirinho. Isso não quer dizer que tenha havido algumas criações maravilhosas no curso da história. Mas compara-los com os deuses é desprezível. É possível ter comparações óbvias, como dizer que o Flash parece um pouco com Hermes, ainda mais o herói da Era de Ouro, que tem asas em seu capacete. Também o Falcão da Noite parece um pouco com Horus, porque também tem uma cabeça de falcão. Mas isso acontece porque seus criadores tomaram estes temas como inspiração".
Alan Moore



"Será que foi bom?" - Dilemas indígenas

"Eu pensava que era ruim amansar, mas agora vi que é bom. Será que foi bom? Uau, uma máquina grande meus filhos conseguiram! Ficam lá trabalhando, sem dormir, pensando de noite [em comboiar a madeira] quando vem a chuva. Será que são mesmo Matsés? Meus filhos ficam com sono, vão se molhar na chuva grande que vai até amanhecer. Meus filhos trabalham muito! Uau, conseguiram um motor grande! Conseguiram uma máquina grande depois de conseguir dinheiro".

Trecho de relato de um idoso da etnia indígena Matsés (Vale do Javari) registrado em 1992 pelo antropólogo Walter Coutinho. Grifos meus.


terça-feira, 9 de junho de 2020

segunda-feira, 8 de junho de 2020

Careta, Mutreta e a penúria brasileira

Adaptado de uma conversa no WhatsApp; dedicado à prima Leilane e aos amigos Tiago e Vinicius, batalhadores do magistério
Então, prima, a epopeia de Careta e Mutreta é uma história anterior ao meu nascimento... Foi numa das primeiras escolas em que minha mãe trabalhou, lá pelas bandas da Zona Oeste, por volta de 1972.

Certa vez minha avó foi se encontrar com minha mãe na porta da escola, pois de lá iriam resolver alguma coisa. Enquanto esperava a hora da saída, minha avó ficou na calçada conversando com uma das mães de alunos, uma conversa bem agradável.

Quando as crianças começaram a sair da escola, minha avó se despediu e perguntou à interlocutora qual era o nome de seus filhos, para depois checar se eram alunos de minha mãe. Então a senhora respondeu algo assim:

"Ih, minha senhora, lá em casa só quem sabe o nome das crianças é o meu marido. Eu só sei os apelidos. Os dois mais novinhos são Careta e Mutreta!"

"Careta e Mutreta", para quem não lembra, era um desenho animado dos estúdios Hannah-Barbera, protagonizado por um abutre e uma cobra, na mesma linha de Tom, Jerry, Coiote, Papa-Léguas, entre tantos outros, em que um predador se dá mal tentando capturar uma presa.

Os meninos não eram alunos de minha mãe, mas ela foi se informar com as colegas e acabou descobrindo que eram irmãos gêmeos, com nomes compostos e parecidos, algo como João Pedro e João Paulo - em família, Careta e Mutreta.

É um caso extremo, mas professores e funcionários encontram várias situações semelhantes nas escolas municipais. Pais que não sabem a turma dos filhos ou a série escolar são o trivial. Mas também é muito comum chegarem pais que não sabem de cor a data de nascimento ou o nome todo dos filhos. Já presenciei um pai que não sabia dizer o nome do "Carlinhos", até que a filha mais velha, que o acompanhava, se recordou - com algum esforço - que o irmão se chamava Carlos Alberto (ao menos nos registros civis).

Enfim, essas situações são um retrato da nossa população: pouco letrada, sem muita preocupação com o universo das formalidades institucionais e da documentação escrita. Marcas de nossa formação social. Por sinal, é muito sintomático que a mãe dos gêmeos se lembrasse mais dos apelidos associados à televisão, que então se expandia no Brasil, que dos nomes registrados na certidão de nascimento. Ainda hoje sentimos os estranhos efeitos do atabalhoado ingresso de uma sociedade parcamente letrada no mundo das comunicações de massa.

Quanto à "lenda de Careta e Mutreta", o ideal era ouvir minha avó e minha mãe contando a história juntas - minha esposa e minha tia são testemunhas. Infelizmente minha avó não está mais entre nós, então quem viu, viu...
Careta, o abutre e Mutreta, a cobra; ou o contrário.

"No Brasil as coisas aparentemente funcionam para darem errado. Consequentemente, se dá certo é porque algo saiu errado. E se deu errado então está tudo certo".
Roger Marques

sexta-feira, 5 de junho de 2020

"Caráter discutível"

Caráter discutível todos temos. O problema está nas pessoas com caráter "indiscutível". Como diz meu psiquiatra, os únicos seres humanos absolutamente isentos de contradições são os sociopatas. Estes sabem o que querem e fazem qualquer coisa para obter, sem a menor sombra de escrúpulos. Ao resto de nós, cabe caminhar na corda bamba de nossas consciências.

quinta-feira, 4 de junho de 2020

Das curvas

Os vales quase sempre importam mais que os picos. No fim das contas, a vida se resume sempre a escapar da pior hipótese - a melhor das hipóteses quase nunca se concretiza. Contar com a sorte é típico dos tolos.

quarta-feira, 3 de junho de 2020

Imprensa, liberdade e responsabilidade

"A imprensa é uma grande força, mas, assim como uma torrente descontrolada de água submerge paisagens inteiras e devasta plantações, assim também uma pena descontrolada só serve para destruir. Se o controle for exterior, ele se torna mais venenoso que a falta de controle. Só pode ser vantajoso se exercido internamente. Se essa linha de raciocínio for correta, quantos jornais do mundo passariam pelo teste? Mas quem poria fim aos inúteis? E quem deveria ser o juiz? Os úteis e os inúteis, assim como o bem e o mal de forma geral, precisam continuar a existir juntos, e o ser humano precisa fazer sua escolha".
Gandhi

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Cansaço político

Há alguns meses li uma reportagem onde uma senhora americana se dizia cansada de Trump, que ela só desejava encostar a cabeça no travesseiro e descansar sem pensar na próxima bobagem que o presidente vai aprontar. Me identifiquei totalmente com essa fala...

Pandemia na Vila do Chaves

Seu Madruga
Ficou em casa, pedindo delivery da venda na conta da Dona Florinda.

Chiquinha
Fugiu pela janela, mas só pegou catapora.

Seu Barriga
Como tem um coração imenso, suspendeu a cobrança do aluguel durante a quarentena.

Chaves
Internado por COVID-19, mas feliz: no hospital tem desjejum, almoço, lanche, jantar e ceia garantidos, todo dia.

Dona Florinda
Abriu o restaurante, porque a economia não pode parar. Tomou cloroquina e teve um piripaque colateral.

Quico
Em isolamento domiciliar com COVID-19.

Professor Girafales
"Não me passa isso, moleque!"

Dona Clotilde
Ficou em casa com Satanás.

Jaiminho
Evitou a fadiga e chegou atrasado para a pandemia...

Dona Neves
Já saiu da Gripe Espanhola imunizada contra tudo e contra todos, de pandemias a senhorios.

Godinez
"Quarentena? Que quarentena?!"



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