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terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Meias-verdades são mais perigosas que mentiras inteiras - principalmente quando aquele que as espalha acredita nelas sinceramente. Enganar a si mesmo é mais trabalhoso que enganar a terceiros.

"A ascensão Skywalker" - Impressões

Fui ontem ver o Episódio IX. Minha expectativa era 0, mas acabei dando nota 8.25.

Com muitas ressalvas, dá para dizer que o filme é bom. Cheguei ao cinema sem qualquer expectativa, as primeiras cenas me deixaram indignado, mas depois o filme me conquistou. Contudo, é apenas um remendo, nada além disso: o maldito Episódio VIII arruinou a trilogia, enquanto conjunto.

Quanto ao Episódio IX... Vejamos: o argumento é tosco, o roteiro é cheio de buracos e deixa um monte de pontas soltas - apesar de tudo isso, milagrosamente, o filme funciona. É um besouro cinematográfico: não devia voar, mas voa. 

Depois de todas as lambanças cometidas por Ryan Johnson no filme anterior, J.J. Abrahams salvou heroicamente o que dava para salvar dessa trilogia. Ainda assim, na minha opinião, episódios VIII e IX conquistaram os respectivos títulos de pior e segundo pior filmes de Star Wars. Ninguém precisa mais reclamar do Episódio I - deixem Jar Jar Binks em paz!


domingo, 29 de dezembro de 2019

Burrice e Conservadorismo

"Eu nunca quis dizer que os conservadores são geralmente burros. Eu quis dizer que pessoas burras são geralmente conservadoras".
John Stuart Mill

sábado, 28 de dezembro de 2019

Do letramento carioca - Ainda

Dedicado aos amigos Marcos e Filipe, interlocutores dessa reflexão

Acho que o fechamento de livrarias físicas - em parte - tem a ver com a concorrência das compras virtuais, dos e-books etc. Mas é fato que o carioca "médio" (se é que isso existe) não é chegado à coisa. De vez em quando pergunto a meus alunos de Ensino Fundamental e Médio sobre hábitos de leitura e muitos (a maioria, no Fundamental) NUNCA entraram numa livraria. Alguns se espantam ao saber que numa livraria é possível folhear livros sem pagar. Muitos relatam ler menos de um livro por ano, nunca ter lido um livro com mais de 100 páginas ou nunca ter lido um livro inteiro. Tenho uma anedota ainda mais significativa: minha escola municipal fica perto do Norte Shopping, onde (ainda) há uma Saraiva MEGAstore; muitos alunos meus, embora frequentassem o shopping, nunca tinham notado a existência da imensa livraria. Apesar do tamanho da loja, ela permanecia quase literalmente invisível para eles. 

Vivemos numa cultura fundamentalmente iletrada - e isso não tem a ver apenas com desigualdade social. Meus alunos de Ensino Médio passam por processo seletivo; a maioria deles é de classe média baixa e cursou o fundamental em escola particular - ainda assim leem pouco, apresentam dificuldade ao interpretar textos e não dominam plenamente a expressão escrita. Mesmo pessoas com formação universitária pouco leem. Conheço médicos, engenheiros e até professores sem hábitos de leitura consolidados. Já tive alunos de graduação que mostravam profunda aversão à sugestão de gastar dinheiro com livros. Enfim, a leitura e o livro ocupam papel marginal na cultura brasileira e carioca e, obviamente, os lugares que vendem livros padecem do mesmo mal.

A crescente prevalência de filmes dublados nas salas de cinema, penso eu, é fenômeno correlato. Quem já tem dificuldade de ler textos "fixos" terá dificuldade ainda maior em acompanhar o ritmo das legendas de um filme. O fechamento de livrarias e a escassez de sessões de filmes legendados são sintomas da mesma doença.

Ao falar numa cultura fundamentalmente iletrada, penso, com efeito, nos fundamentos históricos brasileiros, nos alicerces culturais de nosso povo. Vale lembrar alguns clichês historiográficos que permanecem relevantes para pensar a temática; a comparação com a experiência da América espanhola é bastante reveladora, como já sugeria o clássico Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda. Enquanto a coroa hispânica fundava suas primeiras universidades em solo americano no século XVI, a primeira universidade brasileira ainda não completou sequer cem anos! Durante todo o período colonial só houve uma tipografia na América portuguesa, de duração efêmera e fundação tardia, na segunda metade do século XVIII, enquanto nossos hermanos já imprimiam livros desde o primeiro século de colonização. Isso obviamente não significa que os hispano-americanos fossem majoritariamente letrados, nem que a escrita e a leitura fossem completamente irrelevantes no âmbito colonial luso-brasílico, no entanto, fica evidente que há diferenças relevantes em relação à produção e circulação de impressos. Por sinal, penso que não haja exagero em dizer que a monarquia e a hierarquia eclesiástica lusitanas foram, de longe, as instituições europeias mais reticentes em relação à produção e circulação de material impresso, sempre visto como potencial ameaça à Fé e ao Império.

Não quero com isso postular ou inferir qualquer tipo de inferioridade inerente ao nosso processo de formação histórica, muito menos arvorar um discurso de fatalismo histórico. Pretendo apenas constatar que a precariedade da cultura letrada no Brasil é parte de um processo de longa duração, lembrando ainda que as políticas educacionais durante o Império e a República foram e continuam sendo inconsistentes - apenas no Estado Novo a Educação começou a ser pensada (um pouco) mais seriamente enquanto política pública, e desde então vem seguindo caminhos tortuosos, com seus altos e baixos. Uma figura mais que emblemática dessa árdua e inglória luta é o pouco lembrado Anísio Teixeira, cujas pequenas vitórias e grandes derrotas lembram a imagem de um profeta que fala aos ventos. Feitas as contas, sou otimista e acho que a educação no Brasil teve imensos avanços quantitativos nos últimos cem anos; nosso grande desafio para o século XXI é melhorar - e muito - a qualidade da estrutura hoje existente.

No entanto, o problema cultural do letramento no Brasil e no Rio não se resume à esfera institucional e às políticas públicas. É importante pensar no papel conquistado pelas mídias de massa no Brasil ao longo do século XX - outro fascinante paradoxo brasileiro.

Consternado com a idiotização das massas pela televisão nos Estados Unidos dos anos 1950, Ray Bradbury imaginou um futuro distópico onde livros seriam queimados como política pública; vivesse ele no Brasil, à mesma época, o pesadelo seria a constrangedoramente pequena quantidade de livros disponíveis para a fogueira...
Como sinalizava o saudoso brasilianista Thomas Skidmore, o Brasil foi muito precoce no que tange à expansão do rádio e da televisão, mas ao contrário de outros países pioneiros nesses setores, nossa população era majoritariamente iletrada na época, o que deu a essas mídias um poder cultural muito peculiar em nosso país. O brasileiro foi fortemente exposto às mídias de massa sem que houvesse um letramento prévio para servir de contrapeso. 

E é claro que tudo isso é um convite à "vidiotia". O exercício da leitura e da escrita é ferramenta importante, talvez essencial, para certo desenvolvimento da introspecção, do pensamento crítico, da capacidade de elaborar e avaliar argumentos entre outras tantas competências vitais para a cidadania plena e efetiva e, num nível mais profundo, para a formação de uma consciência autônoma.

É duplamente sintomático dessa renovada "vidiotia" brasileira o espaço que os livros de youtubers estão ocupando no mercado editorial. Foram os mais vendidos nas últimas bienais e certas livrarias já concedem espaço privilegiado e destacado a essas obras. O maior problema é que livros de youtubers mal podem ser chamados de livros. Geralmente são coleções fragmentárias de textos de qualidade duvidosa, repletos de fotos e figuras com diagramação espalhafatosa. Dificilmente servirão como porta de entrada para leituras mais densas, sofisticadas e edificantes. O livro de youtuber é "vidiotia" impressa e encadernada, para consumo rápido e descarte imediato.

Tudo isso soa bastante elitista (e talvez seja mesmo). Não quero, todavia, atribuir juízos de valor às pessoas iletradas ou postular a superioridade de uma cultura erudita e letrada em relação à cultura popular e oral. Muito pelo contrário, elas podem e devem se complementar. O problema é a substituição da oralidade popular viva e pulsante pela indústria cultural massificada e massificante, simplória, simplista, embalada para viagem e descartável, com a única finalidade de gerar modismos frívolos e lucrativos, programada para a obsolescência. Como já dizia Ariano Suassuna, o que mata o cordel não é Shakespeare, é a novela da Globo - ou, atualizando, o lixo cultural diariamente produzido na e para a Internet...

Biblioteca Nacional: tesouro mudo para cariocas iletrados.

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Rio: Capital Mundial

Todas as livrarias do Rio de Janeiro estão fechando - e nunca foram muitas...

Assistir um filme legendado nos cinemas cariocas se torna mais difícil a cada dia - sem mencionar o inconveniente falatório do público durante a exibição.

Acho que chegou o momento de assumir nossa vocação com o devido orgulho e solicitar à UNESCO o reconhecimento do Rio de Janeiro como "Capital Mundial do Analfabetismo Funcional".

Essa Cidade é realmente Maravilhosa - no sentido medieval do termo...

Seria melhor ir ver o filme do Pelé.


Eu diria que a Lei de Murphy é a Constituição oculta do Brasil.

Vovó Mafalda e o Marxismo Cultural

Esse país começou a se degenerar quando deixaram toda uma geração de crianças exposta a um homem travestido de "Vovó Mafalda". Uma afronta à família tradicional brasileira, aos cidadãos de bem e ao venerável papel das matriarcas.

Pior ainda, Vovó Mafalda instigava sutilmente as crianças a ver os mais velhos como palhaços, criando toda uma geração de baderneiros subversivos, avessos à moral e aos bons costumes. 

Suspeito que Vovó Mafalda seja parte de um plano urdido por Paulo Freire, pela Escola de Frankfurt e pela intelectualidade gramsciana. Aposto que o roteirista da Vovó Mafalda era Marcuse. Uma análise mais detalhada certamente mostrará que a concepção de Vovó Mafalda e Papai Papudo, ridicularizando as figuras da Avó e do Pai, se baseia nas ideias de Engels em "A origem da família, da propriedade privada e do Estado". 

A lição que fica é que devemos preservar nossas crianças da influência nefasta do marxismo cultural que envenena a sociedade brasileira.


terça-feira, 24 de dezembro de 2019

Tropeços na penumbra

O mundo tal como pensado é radicalmente diferente do mundo tal como vivido. 

Pensamos no que vivemos e vivemos como pensamos, sobrando entre essas dinâmicas largo espaço para o desconhecido e o inconsciente, configurando as misteriosas encruzilhadas da intuição. Ação e representação se encontram e desencontram cotidianamente; não devemos subestimar esses encontros, nem superestimar esses desencontros. A experiência do humano no mundo, mais que de luz ofuscante ou escuridão impenetrável, é composta por vastas zonas de penumbra. 

Nascemos, crescemos, vivemos e morremos caminhando na penumbra: não espanta que por vezes tropecemos.

O moinho, paisagem de Rembrandt, um dos grandes mestres da penumbra.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Monstruosidades

Por mais monstruosa que uma pessoa pareça é imprescindível seguir afirmando e reconhecendo sua humanidade - fazer o contrário disso, de modo passional ou pragmático, seria também uma forma de monstruosidade. Para seguir humanos, precisamos reconhecer a humanidade dos "monstros"; em grande medida isso também envolve o reconhecimento da monstruosidade que há em nós mesmos, o que pode ser bastante doloroso.


terça-feira, 17 de dezembro de 2019

"Bolsonaro está fazendo o que prometeu" - Entrevista com o filósofo Ruy Fausto


Ruy Fausto é filósofo, professor emérito da USP. Entre outras obras, lançou recentemente os excelentes livros Caminhos da Esquerda (sobre o qual já prestou gentil entrevista a este blog) e o igualmente brilhante O ciclo do totalitarismo – uma excelente reflexão crítica sobre as ideologias e regimes totalitários de esquerda e direita no século XX. Desta feita, concede entrevista sobre os rumos do governo Bolsonaro em seu primeiro semestre [a entrevista foi originalmente realizada em setembro, mas teve a publicação adiada devido a imprevistos; de todo modo, as considerações permanecem pertinentes alguns meses depois].

Como você avalia o primeiro semestre do mandato Bolsonaro?
Como ele diz – é uma das poucas vezes em que disse a verdade, uma triste verdade – ele não praticou estelionato eleitoral. Está fazendo o que prometeu. Ou, tentando fazer. Liquidar a esquerda, acabar com todas as mediações (congresso, tribunais, no limite acabar com a democracia), destruir a universidade, disseminar o obscurantismo, asfixiar a imprensa. Tudo isso, numa atmosfera de mediocridade e de boçalidade extremas. Vivemos um dos períodos mais sinistros da nossa história.

Na sua opinião, os setores de esquerda (partidários ou não) vêm atuando de modo consistente nesse contexto? O que precisaria ou poderia melhorar?A resistência se revela melhor do que se esperava, mas, apesar de tudo, com insuficiências graves, que em geral refletem o peso do passado. Digamos que, dentro do desastre, houve e há alguns fatores positivos. Primeiro o fato, já antigo, mas que pesou e pesa, de que, se Bolsonaro ganhou com folga, não esmagou o seu adversário. Creio que aquele forcing final da candidatura Haddad, impulsionado aliás, em grande parte, por gente independente, nos salvou. Um Bolsonaro eleito por setenta por cento dos votos válidos teria se transformado num rolo compressor. Depois vieram os escândalos (caso Queiroz, milícias), e as divisões entre eles. As revelações de The Intercept devem ser destacadas, porque não há como subestimá-las. Pode ser que, de novo, tenhamos sido salvos, agora pela atuação de uma agência dirigida por um liberal ("liberal") americano. Também nos ajudaram as divisões entre eles, agravadas por aqueles problemas. Há, aliás, o fenômeno curioso dos trânsfugas, adeptos de Bolsonaro ontem ou anteontem, que tomam posição contra ele. Impossível esquecer o papel que eles tiveram na vitória da extrema-direita, mas, isso posto, têm participado da crítica de modo muito aguerrido, e às vezes até brilhante. Descontemos os cheques que essas figuras emitem em nosso favor, ou antes, contra Bolsonaro, sem dar cheque em branco a eles, porque não sabemos como e onde vão terminar. Acrescentemos ainda a mediocridade gritante do personagem. Ai de nós, se tivéssemos aqui um Orbán ou um Erdogan. Bolsonaro é politicamente tão ruim ou pior do que eles, mas não tem a habilidade que os outros revelam. Suas intervenções são uma sucessão de desastres, digo, também para o seu próprio campo. Mas não nos enganemos. Isso é um aspecto. O outro é precisamente a fidelidade dele ao seu próprio programa. De forma que a gente nunca sabe se a gaffe foi apenas ou exatamente isso, ou pelo contrário, uma medida pensada e intencional. Acho que as duas coisas. Por exemplo, ele continua elogiando torturadores para cristalizar os trinta por cento de eleitores de que dispõe (perdeu uns vinte cinco), mas com isso e outras coisas mais (discursos escatológicos, intervenções brutais na administração, nepotismo, irresponsabilidade absoluta nas nomeações, às vezes confiada a um guru quem nem conhece a pessoa – e que pessoa – escolhida, destruição da Amazônia etc); ele vai se queimando, inclusive com forças importantes do establishment. Estes andam considerando se um defensor tão reacionário quanto, mas menos barulhento e mais prudente, não seria, no fundo, preferível.
E a esquerda? Em parte reagiu bem, aproveitando as barbaridades do segundo ministro da educação (personagem arquimedíocre além de obscurantista e reacionário), e organizou manifestações que tiveram algum ou (no caso da primeira) bastante sucesso. Também a literatura jornalística antibolsonaro é a destacar. Aguda, sarcástica, mobilizando alguns dos melhores jornalistas, mais cientistas políticos e professores universitários, em geral. A atuação no congresso, até onde pude acompanhar, teve altos e baixos (como diziam outrora os comentadores esportivos). Uma massa de congressistas meio perdida diante do desastre, e não sabendo bem por onde começar, e certo número de deputados e deputadas (acompanhei mais de perto as sessões da Câmara) intervindo de modo muito eficaz e convincente. Não se pode deixar de destacar a atuação do lider da oposição, Alessandro Molon, embora ele não tenha sido o único a acertar. Mas com tudo isso, a esquerda não se mostra suficientemente forte. Sua debilidade tem raízes históricas. O partido de esquerda que foi hegemônico (não sei se ainda o é) apoia a sua política (eu diria quase: resume) na campanha pela liberação de Lula. Ninguém duvida, principalmente depois das revelações de The Intercept, que o julgamento de Lula, referendado ou não por um fieira de juízos, foi irregular e fraudulento. Lutar para que seja solto, tudo bem, isso se impõe. Mas há ai dois problemas: um é o de que o PT tenta insinuar, aproveitando as revelações, que as práticas dos governos petistas e do PT em geral, foram perfeitamente inocentes. Nada mais falso. As revelações de The Intercept não apagam erros e abusos, e em geral o fato de que havia, sim, promiscuidade entre parte do poder econômico e o poder petista. Nem apagam outros escândalos e casos graves, a começar pelo "mensalão". Apesar das aparências, isso tudo pesa hoje em dia. O PT não sabe, mas está desgastado. E também por isso, embora não só por isso, precisamos de uma política que não se limite a pedir a liberdade de Lula, e, de forma geral, que diga a verdade… Sem falar na desastrosa ambiguidade que o PT continua alimentando (é o mínimo que se pode dizer) a propósito do que significa o governo Maduro, na Venezuela. Não basta dizer que “cometeu alguns erros“. Isso só não se afirma (os crentes!) de Deus… Enfim, esses fatores impedem levar adiante uma luta contra o bolsonarismo que seja realmente eficiente e amplamente mobilizadora. Precisamos contar com toda a esquerda (e uma esquerda que esteja mais preocupada com o seu interesse geral, que é o do país) do que com os interesses de burocracias partidárias, para alavancar o conjunto das forças democráticas.

Muitos analistas afirmam que estamos vivendo sob uma espécie de "parlamentarismo brando" ou "parlamentarismo branco". O que você pensa disso?
Certos cientistas políticos, cada vez mais raros, aliás, insistem em ver o processo como se tratasse de mais um episódio de uma pretensa luta entre executivo e legislativo. Sem negar o interesse em estudar como atuam tais forças na situação atual, dar esse privilégio a certas noções tradicionais no bojo da tentativa de compreender o que se passa hoje no Brasil e no mundo, é de um total provincialismo - um formalismo provinciano. Prefiro não entrar nessa discussão, que inserida num contexto substantivo, poderia ser interessante, mas tal qual ela vem sendo formulada tem pressupostos mistificadores.

Em sua opinião, quais seriam as alternativas para a esquerda nas eleições presidenciais de 2022?
Precisaríamos de um candidato único, é claro. Mas essa possibilidade torna-se cada vez mais fraca. Ciro parece ter rompido definitivamente com o PT (ele tinha lá suas razões para se distanciar do PT, mas o seu comportamento, desde o segundo turno das eleições de 2018, foi irresponsável). Quanto ao que fará o PT, não sabemos. Também não sabemos como se comportarão as outras forças e os outros partidos de extrema-esquerda, de esquerda ou de centro esquerda, como o PSOL e o PSB. O ideal seria uma articulação que mobilizasse pelo menos parte importante das formações e movimentos de oposição. A direita irá àquelas eleições (se houver eleições) certamente dividida: com Bolsonaro (ou representante), mais Dória, e ainda, provavelmente, um candidato de centro-direita tipo Huck. A esquerda também irá dividida. Apenas entre PT e PDT? Não sabemos. E qual seria o candidato do PT, já que, quanto ao PDT, parece certo que escolherão de novo Ciro. Haddad continua sendo um bom nome, apesar de muito desgastado pelo oportunismo do partido (Gleisi relutou até o fim a propor a candidatura de Haddad, o humilhou o quanto pôde, e dentro do partido havia – e parece que ainda há – a turma do "Lula ou nada"). Seria possível ainda tentar a chapa Ciro/Haddad, que não conseguiu se estruturar em 2018? Longe de mim, supor que Ciro é um nome ideal. Mas na situação muito grave em que estamos, todas as possibilidades devem ser examinadas. Há aliás outros nomes no PT, como o do atual governador da Bahia. Fora do ex-partido hegemônico, há o governador do Maranhão, Flávio Dino, prejudicado por se apresentar como candidato de um partido que se intitula comunista. Isso não pega bem em lugar nenhum no final da segunda década do século XXI, nem fora nem dentro da esquerda. O que não quer dizer que socialismo ou mais precisamente, esquerda democrática não pegue, por mais que o nome socialismo tenha sido maltratado pela esquerda totalitária. Veja-se o curso surpreendente da campanha eleitoral americana.

Que lições você acha que o povo brasileiro será capaz de tirar até 2022 da situação política corrente?
Espero – sou talvez meio otimista, aqui – que a experiência sinistra do governo Bolsonaro queime definitivamente a extrema-direita, e consideravelmente a direita que direta ou indiretamente o elegeu. Talvez – de novo, sendo bastante otimista ­­– tudo isso termine num banho frio para as direitas, em geral. A partir da gritaria em torno da famosa "roubalheira do PT", essa gente elegeu um personagem corrupto, violento, bronco, cujas posições representam o que existe de mais regressivo na atual política mundial. Os bolsonaristas não são exatamente fascistas, porque lhes faltam alguns traços do fascismo. Mas eles são certamente aparentados com o fascismo. Diria que são primos dos fascistas. Defendem o que é possível defender do fascismo no final da segunda década do século XXI. Mas esse fascismo possível do nosso século é suficiente para destruir as nossas instituições. Sem falar no problema que hoje talvez seja o mais importante de todos. A extrema-direita joga hoje, no plano mundial, a carta da destruição da vida no planeta. O ceticismo diante do aquecimento global, aquecimento hoje comprovado por praticamente a totalidade dos cientistas de todos os continentes, representa uma política literalmente suicida, de quem grita, como os fascistas espanhóis em outro tempo: "viva la muerte". Pois eles não se limitam a professar opiniões céticas diante do que ocorre no Antropoceno: eles agem em consequência. A destruição da floresta amazônica é o presente mais terrível, porque irreversível se não conseguirmos parar o carro a tempo, que nos lega o bolsonarismo.


sábado, 14 de dezembro de 2019

Heróis, inimigos e ideologias

Parafraseando Cazuza (do qual nem gosto): meus heróis morreram de velhice e meus inimigos estão no poder... Quanto às ideologias, não preciso de nenhuma delas para viver.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Merry Trumpmas!


Códigos: genético ou postal?

-Preparado para um mundo onde um teste de DNA de US$ 50 pode prever suas chances de obter um doutorado ou que criancinha* vai entrar em uma pré-escola seletiva?
-Já se pode fazer isso com um CEP.

*O termo "toddler" é difícil de traduzir em português; significa algo como criança na fase em que começa a andar. 

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Não sejamos ingênuos

O homem, infelizmente, é lobo do homem; não podemos nos iludir com aqueles que promovem seus interesses particulares como se fossem interesses coletivos.

Muita gente que se diz preocupada com o "desenvolvimento da nação" está muito mais interessada no desenvolvimento de patrimônio pessoal e familiar às custas do contribuinte ou de seus empregados.

Quando o patrão pede para "vestir a camisa" da empresa geralmente ele deseja que você produza mais sem pagar proporcionalmente por isso. Nessa hora, lembre-se que profissional não é jogador e empresa não é clube de futebol. Por sinal, hoje em dia, nem os futebolistas profissionais costumam "vestir a camisa" dos seus respectivos clubes, apesar dos salários milionários.

Cumpra suas obrigações com honestidade, dignidade, lealdade, dedicação e profissionalismo, mas nunca esqueça que o "amor" acaba na hora dos cortes de pessoal - e demissão pode ser mais litigiosa que divórcio, dependendo do caso.

Já trabalhei numa pequena empresa cujo dono dizia que éramos "uma família" - mas nunca me convidaram pra ceia de Natal. Saí dessa empresa, inclusive, pelas práticas desonestas que ela praticava contra os clientes: preferi ficar desempregado a seguir trabalhando para gente inescrupulosa.

Quando comuniquei meu desligamento da empresa, a pretexto de concentrar meus esforços no mestrado, simpático como sempre, meu patrão afirmou com comovente sinceridade que fazia absoluta questão de me pagar R$ 400,00 que me devia por alguns serviços prestados.

Aguardo até hoje...

Pensando bem, a clássica expressão é quase uma ofensa aos lobos de verdade.

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Férias em Mustafar

-Para onde você vai nas férias?
-Vou para o Lado Sombrio da Força.
Escondam bem as crianças. 

segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

Humildes Catedrais

Fazendo da raiz alicerce, emergem, pouco a pouco, grão a grão, singelas, frágeis, humílimas catedrais. Há algo de assombrosamente majestoso nesses pequenos colossos, erguidos por tão ínfimas construtoras. Há algo de sublime nesses edifícios que se erguem plácida e silenciosamente, sem qualquer sombra de vaidade, orgulho, cupidez ou ambição. Cândida grandiosidade, instintiva proeza de desapaixonado impulso vital. Fosse eu uma cigarra, cantaria o glorioso triunfo arquitetônico das formigas.








Vert-Galant

O Brasil anda muito necessitado de alguém como o saudoso Henrique de Navarra...

quarta-feira, 4 de dezembro de 2019