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segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Religiões e Iluminismo

"Assim, quando olhamos para as origens religiosas do Iluminismo, não as descobrimos em uma única Igreja ou seita. São encontradas em ambas as Igrejas [calvinista e católica] e em várias seitas. O que é comum aos homens que expressam tais ideias é que todos são, em certo sentido, heréticos: ou seja, pertencem a grupos dissidentes dentro de suas Igrejas ou são eles próprios encarados como não-ortodoxos. As Igrejas ortodoxas - católica, luterana, anglicana, calvinista - olham de soslaio para eles. [...] O Iluminismo do século XVIII, ao vir, seria uma reunião de todos os heréticos, a reintegração de um movimento [o humanismo] que a revolução religiosa tinha interrompido e transformado, mas não podia destruir".

Hugh Trevor-Roper, historiador

Vértebras, sapos e greve

Alguns servidores públicos se curvam tanto perante as arbitrariedades que às vezes penso que poderíamos classificá-los como invertebrados.

SERVIDORES do Estado do RIO, já passou da hora de vomitar todos os SAPOS engolidos. GREVE GERAL!!!

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

4 considerações sobre a política e o poder

A - Um governo deve ser elogiado pelo que faz de positivo. 

B - Um governo deve ser criticado pelo que faz de negativo. 

C- As afirmações A e B não são mutuamente excludentes. 

D - A postura descrita na afirmação B é mais importante e necessária ao exercício da cidadania e à prática democrática que a postura descrita na afirmação A.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Perguntas sobre o mundo desde 11 de setembro de 2001

1) O que é um "limite claro"? 

2) O que é um "excesso"? 

3) Quem estabelece ou deve estabelecer esses limites e excessos? 

4) Onde acaba a intervenção e onde começa o intervencionismo? 

5) Toda intervenção precisa ser militar? 

6) Quem define o que é "omissão"? 

7) Segundo quais critérios? 

8) Quantas vidas a intervenção tira? 

9) Quantas ela poupa? 

10) Por quanto tempo uma intervenção pode se prolongar antes de se tornar tirânica? 

11) Uma guerra que se degenera em guerra civil é menos pior que um regime autoritário? 

12) O Afeganistão melhorou depois dessas intervenções? 

13) E o Iraque? 

14) E a Síria? 

15) A intensidade do terrorismo internacional aumentou ou diminuiu? 

16) Quais são as consequências de continuar percorrendo esse caminho a curto, médio e longo prazo? 

17) Quais são os custos econômicos e sociais desse curso de ação? 

18) Esses recursos não poderiam ser empregados de modo mais proveitoso? 

19) Quem lucrou com tudo isso? 

20) Essas perguntas são "fantasiosas"?

Authoritarian Leftism: The ACTUAL "Regressive Left"


Achei o vídeo muito interessante. Debate algumas questões atualíssimas com uma serenidade e um equilíbrio que andam muito raros por aí. Diria que concordo com 95% das opiniões apresentadas. Vale os 20 minutos perdidos. Infelizmente não encontrei versão legendada.

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Ah, la barbe!

Fui hoje a um barbeiro novo, porque o antigo resolveu que não faz mais barba - o que me parece quase surrealista. Um barbeiro que não faz barba é quase como um açougueiro vegetariano. Lá se vão os alegres tempos em que se podia contar com um bom barbeiro para barba, cabelo, bigode, sangria, sutura, amputação e extração dentária.

Enfim, há que se ter alguma resignação quanto aos fados da vida: fui a um novo barbeiro. O camarada - muito simpático, por sinal - me aprontou um corte de cabelo super moderninho que não tem nada a ver comigo. Me sinto como um sobrevivente tardio de uma época que não vivi. Nasci anacrônico e meu mundo se parece cada vez menos com o que ele nunca foi. Ai!

Ando há mais de 10 anos na orfandade capilar. Cortei o cabelo durante 20 anos com um barbeiro que, se ainda estiver vivo, está com 98 anos. Infelizmente as pessoas precisam parar de trabalhar em algum momento da vida. Um cavalheiro como não se faz mais; nunca haverá outro barbeiro como ele.

Shiva derrama uma lágrima para cada coisa que desaparece em sua vertiginosa dança...

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

1ª Carta Aberta ao Sr. César Benjamin, Secretário de Educação da Prefeitura do Rio de Janeiro

Caro Sr. Benjamin,

soube pela imprensa que o senhor foi indicado pelo prefeito Marcelo Crivella como novo secretário de Educação, Esporte e Lazer da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. Confesso que não compreendi essa curiosa fusão de secretarias. De um ponto de vista puramente conceitual a ideia de integrar educação, esporte e lazer é interessante, mas me parece muito problemática em termos administrativos. Afinal de contas, a rede municipal do Rio de Janeiro já era a maior da América Latina, e funcionamos no limite do aceitável. Não percebo claramente quais seriam as vantagens imediatas dessa medida que talvez gere uma secretaria mais inchada e sobrecarregada do que já é.

Por outro lado, sua indicação ao cargo me causa espécie. Durante a campanha eleitoral, Crivella insistira que comporia um secretariado técnico. Pesquisando seu currículo, percebi que o senhor não tem carreira na área educacional; sua experiência no setor editorial talvez o qualificasse melhor para a Secretaria de Cultura, me parece.

Enfim, ouvi a entrevista que o senhor concedeu recentemente ao site SRzd, onde afirmava que sua prioridade seria dialogar com os professores. Se isso se concretizar, será realmente bom. Infelizmente ficamos escaldados pela gestão de Claudia Costin, que entrou na secretaria em 2009 com a mesma proposta, mas na prática conduziu uma administração extremamente autoritária, onde as decisões mais relevantes vinham unilateralmente do nível central da SME. Durante as greves de 2013 e 2014, curiosamente, a secretária que tanto desejava dialogar se recusava sistematicamente a negociar com os grevistas da Educação. Espero que com o senhor, as coisas corram de modo diferente.

Confesso que achei muito bonita a sua carta divulgada no site Rio Educa. Espero que essas belas palavras se tornem realidade durante sua gestão.

Como professor da rede, tomo desde já a iniciativa de começar a dialogar com o senhor. Nesse sentido, gostaria de apresentar-lhe algumas de nossas principais demandas e reivindicações. Apesar da deselegância, prefiro organizar em tópicos, para maior clareza:

-cumprimento da lei federal do 1/3 de carga horária semanal para planejamento de atividades;

-mudança do sistema de avaliação da rede, que quase todos os professores consideram um método velado de aprovação automática;

-contratação de profissionais de apoio para as escolas;

-revisão do Plano de Cargos e Salários, que nos foi arbitrariamente imposto em 2013;

-redução do quantitativo de alunos por turma, para evitar as salas de aula superlotadas;

-fim das provas da SME, que só existem para facilitar a aprovação de alunos, desqualificando o trabalho dos docentes de Matemática, Ciências e Língua Portuguesa.

Essas são apenas algumas demandas existem muitas outras. Ficaremos satisfeitos se o senhor se mostrar realmente disposto a discuti-las conosco. Estaremos vigilantes a cada passo de sua gestão.

Cordialmente,
Luiz Fabiano de Freitas Tavares
Professor de História da Escola Municipal Quintino Bocaiúva
Servidor municipal desde 2008

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Seu Pezão

Pezão parece até o Seu Madruga. Daqui a pouco vai até propor aos servidores trocar algumas parcelas de salário por uma fazenda de casimira inglesa "made in Taubaté". Meu medo é que ele resolva pagar "tudinho de uma vez no fim do ano". Nenhuma servidora por aí disposta a bancar a Dona Florinda...?

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Limites e diferenciações do humano

Interessante trecho do já clássico Pureza e perigo, de Mary Douglas:

Radin interpreta o mito Trickster dos índios Winnebagos em linhas que servem para iluminar este ponto [a autoconsciência e a procura consciente da objetividade]. Aqui está um paralelo primitivo ao tema de Teilhard de Chardin de que o movimento de evolução tem sido em torno de uma crescente complexidade e autoconhecimento.

Estes índios viviam em condições técnicas, econômicas e políticas as mais simples e não-diferenciadas. Seu mito contém suas profundas reflexões sobre toda a questão da diferenciação. O Trickster começa como um ser amorfo e sem autoconsciêntica. Com o desenvolvimento da história, ele descobre, gradualmente, suas próprias partes anatômicas; oscila entre feminino e masculino, mas termina por fixar seu papel sexual masculino; e, finalmente, aprende a avaliar seu ambiente pelo que este é. Radin diz em seu prefácio:

Ele não deseja nada conscientemente. A todo momento é obrigado a se comportar da maneira como se comporta, devido a impulsos dos quais não tem controle... está à mercê de suas paixões e apetites... não possui nenhuma forma definida e bem fixada... acima de tudo, um ser incoado de proporções indeterminadas, uma figura prenunciando a forma de homem. Nesta versão, ele possui intestinos enrolados em volta de seu corpo e um pênis igualmente comprido enrolado em seu corpo, com seu escroto na ponta.

Dois exemplos de suas estranhas aventuras ilustrarão esse tema. Trickster mata um búfalo e está abatendo-o com uma faca na mão direita:

No meio de todas estas operações, seu braço esquerdo agarrou repentinamente o búfalo. "Dê-me isto de volta, é meu! Pare ou usarei minha faca em você!" Assim falou o braço direito. "Cortarei você em pedaços, isto é o que farei com você", continuou o braço direito. Nisso o braço esquerdo desprendeu sua presa. Mas pouco após o braço esquerdo agarrou novamente a presa do braço direito... e isto repetiu-se muitas vezes. Desta maneira, Trickster fez seus dois braços lutarem. Esta luta transformou-se logo numa luta feia e o braço esquerdo ficou muito machucado...

Em outra história, Trickster trata seu próprio ânus como se pudesse agir como um agente e aliado independente. Ele tinha matado alguns patos e antes de ir se deitar manda seu ânus vigiar a carne. Enquanto está dormindo, algumas raposas se acercam:

Quando elas chegaram perto, para surpresa delas, foi expelido um gás de algum lugar. "Pum", ouviu-se. "Cuidado! Ele deve estar acordado", e elas fugiram. Depois de algum tempo uma delas disse: "Bem, acho que agora ele está dormindo. Aquilo era um blefe. Ele está sempre usando alguns truques". Então, elas se aproximaram novamente do fogo. O gás foi expelido de novo e elas novamente fugiram. Isto aconteceu três vezes... Então o barulho de gás expelido foi mais alto, ainda mais alto. "Pum! Pum! Pum!" Porém, elas não foram embora. Pelo contrário, começaram a comer as partes assadas do pato...

Quanto Trickster acordou e viu que o pato não estava lá:

..."Oh! Você também, objeto desprezível, isto é coisa que se faça? Não lhe disse para que vigiasse o fogo? Você se lembrará disto! Como punição pelo seu descuido, queimarei sua boca e você não a usará a mais!" Então pegou um pedaço de madeira em chamas e queimou a boca de seu ânus... e gritou de dor pois estava castigando a si próprio.

Trickster começa isolado, amoral, inconsciente, desajeitado, ineficaz, como um animal bufão. Vários episódios podam e colocam corretamente seus órgãos corporais, e, assim, ele termina se parecendo com um homem. Ao mesmo tempo, ele começa a ter um conjunto mais coerente de relações sociais e a aprender duras lições sobre seu ambiente físico. Num importante episódio, ele confunde uma árvore com um homem e responde-lhe como faria a uma pessoa, até que, finalmente, descobre que ela é uma coisa meramente inanimada. Assim, aprende, gradualmente, as funções e limites do seu ser.

Considero esse mito como uma bela afirmação poética do processo que leva desde os primeiros estágios da cultura à civilização contemporânea, diferenciados em várias maneiras. O primeiro tipo de cultura não é pré-lógico, como Lévy-Bruhl, infortunadamente, intitulou-o, mas pré-copernicano. Seu mundo gira ao redor do observador que está tentando interpretar suas experiências. Gradualmente, ele se separa de seu ambiente e percebe suas limitações e poderes reais. Este mundo pré-copernicano é, acima de tudo, pessoal. Trickster conversa com as criaturas, coisas e partes de coisas, sem discriminação, como se fossem seres animados, inteligentes. Este universo pessoal é o tipo de universo que Lévy-Bruhl descreve. É também a cultura primitiva de Tylor e a cultura animista de Marett e o pensamento mítico de Cassirer.

domingo, 8 de janeiro de 2017

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Star Wars antes de STAR WARS

Interessante vídeo lembrando que Star Wars nem sempre foi o que conhecemos - sob vários aspectos... Mais ainda, o vídeo lembra que o planeta Terra era um tanto diferente algumas décadas atrás. Os comentários racistas de David Prowse feitos na mais perfeita ingenuidade (ou não) são particularmente reveladores.

"A storm is coming"



Interessante diálogo de The Dark Knight Rises, de Chris Nolan

Bruce: Não parece feliz de me ver.

Selina: Você não era inválido?

Bruce: Senti vontade de tomar um pouco de ar fresco...

Selina: Por que não chamou a polícia?

Bruce: Tenho um amigo poderoso que cuida dessas coisas para mim. É um disfarce audacioso para uma ladra.

Selina: É? Quem você está fingindo ser?

Bruce: Bruce Wayne, bilionário excêntrico. Quem é seu par?

Selina: A esposa está em “Ibitsa”. Deixou os diamantes. Medo de roubo.

Bruce: É “Ibiza” que se fala. Não vai querer que saibam que é ladra, não alpinista social...

Selina: Acha que me importo com o que pensam de mim aqui?

Bruce: Duvido de que se importe com o que pensam de você em qualquer lugar.

Selina: Não me subestime, Sr. Wayne. Não sabe nada sobre mim.

Bruce: Bem, Selina Kyle, sei que veio do seu prédio sem elevador. Modesto para uma grande ladra de jóias. Ou está economizando para sua aposentadoria ou... está envolvida com as pessoas erradas.

Selina: Não pode me julgar porque nasceu na suíte Master da Mansão Wayne.

Bruce: Na verdade, eu nasci na suíte Regência.

Selina: Eu comecei fazendo o que tinha de fazer. Uma vez que começa, nunca mais pode fazer o que quer.

Bruce: Recomece do zero.

Selina: Não há recomeço no mundo de hoje. Qualquer adolescente com um celular descobre o que fez. Tudo que fazemos é registrado, quantificado e usado contra nós.

Bruce: É assim que justifica seus roubos?

Selina: Pego o que preciso de quem tem sobrando; não me aproveito de quem tem pouco.

Bruce: Robin Hood?

Selina: Eu faria mais para ajudar alguém do que a maioria aqui. Mais do que você.

Bruce: Não está supondo coisas demais?

Selina: Talvez VOCÊ suponha demais quanto ao que tem dentro da calça além da carteira...

Bruce: Ai!

Selina: Acha que isso tudo pode durar? Há uma tempestade chegando, Sr. Wayne. Você e seus amigos deviam se preparar, pois quando ela chegar vocês se perguntarão como podiam viver com tanto e deixar tão pouco para o resto de nós.

Bruce: Parece estar ansiosa por isso.

Selina: Sou adaptável...

Jutaí, 2016 - "The fire rises"

Em 2015 o povo do município amazonense de Coari depredou inúmeros edifícios públicos e privados, revoltado com a situação do funcionalismo público local, que não recebia salário havia 5 meses.

Em 28 de dezembro de 2016, apenas alguns dias atrás, episódio semelhante ocorreu em outro município amazonense, Jutaí, onde os servidores não recebem há três meses. A casa da ex-prefeita e uma loja de seu marido foram incendiados.

Nossos governantes deveriam assistir alguns filmes recentes, como The Dark Knight Rises, de Chris Nolan. Como diz Selina Kyle, "uma tempestade está chegando". Ou, como diz o personagem Bane, mais enfaticamente, "the fire rises"...



domingo, 1 de janeiro de 2017

Luz: entre pintores e cientistas

"Antes dos trabalhos de Newton, os pintores ignoravam certas propriedades da luz, o que não os impedira de desenvolver um savoir-faire espantoso. [...] os dados obtidos [pela arqueologia molecular] sublinham a que ponto o artista [Nicolas Poussin] realizou cada uma de suas obras segundo uma unidade de conjunto com uma precisão notável que o conduziu a se tornar teórico da cor e das práticas pictóricas. [...] O procedimento de Nicolas Poussin certamente não foi muito distante daquele que conduziu Isaac Newton a arranjar um prisma e decompor a luz branca: um procedimento que associa observação e experiência, seguidos de raciocínio".

Philippe Walter

A tempestade (c. 1651), Nicolas Poussin, óleo sobre tela

Apologia de Jar Jar Binks

"Sua função é se dirigir às crianças e ser insuportável para todos os demais. A moral da história é que, às vezes, você tem de aturar essas pessoas insuportáveis. Ainda assim é preciso tratá-las com dignidade e respeito. Toda vida tem valor"

Bryan Young, apud Chris Taylor, Como Star Wars conquistou o universo.


Rogue One não precisava de Star Wars (e vice-versa)

Muita gente gostou de Rogue One; algumas pessoas até o consideraram o melhor filme de Star Wars. Eu achei a produção ao mesmo tempo medíocre (enquanto filme) e péssima (enquanto filme da série Star Wars).

Em primeiro lugar, o universo de Star Wars não precisava de Rogue One, que se dedica a explicar (mal) o que não precisava de explicações.

O filme narra o roubo dos planos da Estrela da Morte pela Aliança Rebelde, mencionado no início do Episódio IV, e vai semeando um bocado de contradições e inconsistências pelo meio do caminho. Aponto apenas algumas delas. Logo no início de Uma nova esperança, a princesa Leia censurava Darth Vader por sua violenta abordagem à Tantive IV, uma nave diplomática, enquanto Rogue One mostra a nave recebendo as plantas diretamente, no meio de uma grande batalha espacial. A discreta brecha de segurança na Estrela da Morte sugeria que mesmo os mais poderosos equipamentos possuem seu acidental calcanhar de Aquiles, uma noção bem afinada com a crítica de Lucas à sociedade industrial e à fragilidade dos impérios, enquanto o novo filme "explica" essa falha como algo propositalmente planejado por um cientista dissidente.

Em suma, Rogue One pretende explicar demais, o que pode ser fatal a qualquer fantasia, como bem observava David Mazzuchelli acerca dos quadrinhos: quanto mais realismo se deseja instilar na obra, mais evidentemente irreal parece a premissa original. George Lucas também sabia disso. Conforme nota o cineasta, ninguém precisa saber como "realmente" funciona um hyperdrive - é apenas um equipamento que permite viajar à velocidade da luz, possibilitando que os personagens percorram as distâncias entre planetas. Qualquer explicação (pseudo)científica adicional tornaria hyperdrives, blasters, sabres de luz etc cada vez menos críveis - e não o contrário.


Desde o início, Lucas deu a Star Wars um fundo mitológico, inspirado pela (não muito boa) obra do "mitólogo" Joseph Campbell. Star Wars funciona como um conto de fadas - "A long time ago, in a galaxy far, far away"... O universo criado por Lucas tinha inúmeras e interessantíssimas referências históricas, mas sempre refratadas pelo prisma lendário - "História ouvida à soleira da Lenda", como diria talvez Victor Hugo. Um breve comentário de Gareth Edwards, diretor de Rogue One, mostra sua fatal dificuldade em compreender a premissa: "It's the reality of war. Good guys are bad. Bad guys are good. It's complicated, layered; a very rich scenario in which to set a movie" ["É a realidade da guerra. Caras bons são maus. Caras maus são bons. É complicado, em camadas; um panorama muito rico em que situar um filme"].

Ao contrário do que muita gente fala, o universo criado por Lucas não é tão maniqueísta quanto parece à primeira vista, embora trate a ambiguidade moral de maneira sutil. Afinal de contas, todo mundo sabe que Han atirou primeiro... As próprias mudanças e remendos que Lucas fez em sua obra servem como comentário metalinguístico a essa ambiguidade original. Edwards, pelo contrário, parece pregar essa ambiguidade na testa do espectador a cada instante do filme (com uma marreta).

Han Solo é um personagem "complexo, em camadas" - e, como todas as coisas realmente complexas, isso não fica evidente à primeira vista. Na verdade, Han foi gradativamente evoluindo segundo rumos imprevistos ao longo da produção da trilogia original; descobrimos e desembrulhamos suas "camadas" conforme ele enfrenta inúmeros problemas. Por outro lado, os personagens supostamente complexos de Rogue One querem entregar sua "complexidade" ao espectador embrulhada para viagem desde as primeiras cenas; as tais "camadas" aqui parecem transparentes. O único personagem realmente interessante e intrigante no filme é K-2SO, um robô - e isso diz quase tudo. De resto, como já explorei em outro texto, a obra de Edwards padece do mesmo mal que tantos outros filmes recentes: excesso de personagens e caracterização demasiadamente veemente, resvalando na caricatura.

Tudo isso nos leva à questão inicial: Rogue One não precisava de Star Wars. É apenas um filme de guerra espacial "realista" [sic] que poderia ser situado em qualquer outra galáxia distante. Nesse sentido, é uma obra que reúne os piores "erros" encontrados em outras obras do chamado "universo expandido". Em outra ocasião posso enumerar alguns deles; por aqui, basta uma síntese: o grande equívoco é achar que Star Wars é apenas um universo ficcional, e não um determinado cânone estético.

Há pouco tempo li as primeiras histórias em quadrinhos de Star Wars, produzidas nos anos de 1977 e 1978, logo depois do lançamento do primeiro filme, desenhadas por Howard Chaykin, um dos artistas mais populares da época. Os criadores visivelmente não haviam compreendido a proposta de Lucas - desenvolveram apenas uma série de narrativas protagonizadas por Luke, Han e Leia, mas estritamente aparentadas a outras tantas ficções científicas da época. Não perceberam, por exemplo, que os figurinos de Star Wars tendiam mais ao "histórico" que ao "futurista", assim como não entenderam que o design das naves e tecnologias do filme se afastava significativamente de outras obras do gênero.

É exatamente o que se passa com Rogue One: os personagens, temas, tramas, padrões narrativos e a própria trilha sonora destoam do cânone estético de Star Wars. A abordagem, principalmente, destoa das melhores obras de Star Wars produzidas em inúmeras mídias. Rogue One pretende - pretensiosamente, por assim dizer - ser um filme "sério", enquanto a obra de Lucas tangencia inúmeros temas relevantes, sem jamais se levar excessivamente a sério. O riso é parte vital de Star Wars. C-3PO, R2-D2, Chewbacca e até o recente BB-8 são carismáticos e cativantes porque são engraçados. O riso rompe barreiras entre universos, dando vida àquela galáxia distante. Não à toa o engraçadíssimo pastiche-paródia William Shakespeare's Star Wars é delicioso, enquanto muitos dos livros "sérios" do universo expandido são soporíferos. É claro que isso nem sempre dá certo, como comprova o tão odiado Jar Jar Binks.

Um contraponto pode ser interessante aqui. Em 2015 os irmãos Wachowski lançaram a curiosa fantasia espacial Jupiter ascending, que descreveram como uma mistura de Star Wars com O Mágico de Oz. Embora a aventura não se situe no universo de Lucas, traz uma abordagem muito mais fiel a sua estética que Rogue One. Nesse sentido, vale notar que uma tensão mal resolvida percorre todo o filme de Edwards: por um lado, contém um excesso de referências à saga, piscando para o espectador como se sofresse de um tique nervoso; por outro, busca ostensivamente romper com a estética de Lucas, se afirmando como algo novo. Isso fica muito claro na cena em que, para efeito cômico, a protagonista Jyn ordena silêncio ao droid K-2SO, interrompendo o bordão repetido em todos os filmes anteriores por personagens variados, "I have a baaaad feeling about this".

Obviamente é válido e legítimo produzir diversas abordagens sobre o universo de Star Wars, como já acontece há décadas no universo expandido; há muito tempo passei da idade de ser purista com esse tipo de coisa. Toda a questão consiste em avaliar quão satisfatórios são os resultados - o que, evidentemente, depende de gostos e perspectivas. Minha opinião sobre Rogue One é simplesmente que "the Force is not strong with this one".

Concluindo, há quem diga que George Lucas seguia uma receita de bolo. Na minha opinião, isso diz menos sobre a obra do cineasta que sobre a ignorância culinária daqueles que endossam esse parecer. Qualquer pessoa experimentada em forno e fogão sabe que a receita é apenas o ponto de partida. Alterações sutis na quantidade e proporção dos ingredientes, no movimento de mistura ou na temperatura e tempo de cozimento trazem resultados significativamente diferentes. É por isso que cada um dos episódios produzidos por Lucas tem sabor próprio. Mesmo O Império contra-ataca e A vingança dos Sith são agridoces de maneiras muito diferentes. Rogue One precisava de mais açúcar e menos carbonite...