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quarta-feira, 27 de maio de 2020

Só consigo levar a sério pessoas que não se levam totalmente a sério. Nem tudo é questão de vida ou morte. Há coisas frívolas, efêmeras e banais, que somente pessoas histriônicas conseguem levar a ferro e fogo. Como levar a sério gente que faz tsunamis em qualquer copo d'água?!

segunda-feira, 25 de maio de 2020

Da hipocrisia cristã

O cristão se faz hipócrita quando reivindica para si e para os seus a Graça e deseja rigorosamente impor aos "outros" aquilo que ele mesmo entende por Lei.

Esses "outros" podem ser vários, desde não-cristãos, cristãos de outras denominações ou até de uma mesma denominação, mas que apresentem condutas ou pontos de vista discordantes daquele que, farisaicamente, se crê intérprete autorizado da Lei e dono da ortodoxia, "reta opinião".

Para tanto, reivindica para si a força desta ou daquela "autoridade" inquestionável, seja a Tradição, a Escritura, o Magistério eclesiástico, a inspiração do Espírito Santo, a sucessão apostólica, o ensinamento mediúnico de "espíritos de luz" ou qualquer outra coisa que o diferencie dos demais mortais e pela qual se invista de uma certeza inabalável. No fundo, de uma ou outra maneira, forja a autoridade com que ele mesmo se autoriza.

Tal atitude deriva tanto da arrogância quanto do comportamento de manada, de uma arbitrária e orgulhosa convicção de "eleição" que o faz crer que ele e os seus são, de uma ou outra maneira, melhores que os demais.

É o tipo de gente capaz de prender, torturar, queimar, matar e massacrar em nome de Deus, a depender das circunstâncias sociais e históricas - a trajetória do Cristianismo, infelizmente, está repleta de exemplos assim.

Crendo-se livre de pecado, tal cristão atira a primeira, a segunda e todas as pedras que puder - contra a adúltera, o ladrão, o gay, o maconheiro, a abortista, o comunista e quem mais julgar conveniente apedrejar. Por vezes comemora, aberta ou ocultamente, o sofrimento ou a morte daqueles que tem por inimigos. Se regozija imaginando que este ou aquele arderá nas chamas do "inferno". Como alguns escolásticos, ousa imaginar que Deus perversamente priva seus eleitos de compaixão para que melhor se satisfaçam com o tormento dos pecadores.

Muitas vezes, condena rigorosamente nos outros aquilo que ele mesmo já praticou outrora. Cobra dos demais o severo cumprimento de uma "Lei" que ele mesmo transgredia. Enxerga o argueiro no olho do irmão e não apenas ignora, mas se orgulha da trave com que cobre seus próprios olhos. Fala em Amor, transpirando Ódio.

No fundo, o que lhe vale é o princípio nada cristão: "aos amigos tudo, aos inimigos a Lei". 

Se enxerga como Estêvão, mas age como Saulo.

A tal cristão, em sua zelosamente cultivada cegueira, resta apenas a esperança de, algum dia, realmente ingressar no caminho de Damasco...

Mão que apedreja.

Sobre Moro, Bolsonaro e o vídeo da reunião ministerial

Ninguém, em sã consciência, esperava uma declaração explícita de Bolsonaro falando com todas as letras que queria interferir na PF para proteger os filhos de investigações - seria ingenuidade. 

Todavia, o vídeo serve como evidência circunstancial, a compor o conjunto probatório, como mais uma pecinha do quebra-cabeças, entre outras. 

Do ponto de vista processual, o vídeo é importante para que Bolsonaro esclareça, depondo em juízo, o que quis dizer. Lembrando que ele será interrogado tanto pelo MP quanto pelos advogados de Moro - e tenho certeza de que os advogados de Moro vão jogar duro. 

Uma coisa é falar com jornalista e militante, outra coisa é prestar depoimento - Lula sentiu na pele essa diferença. O próprio Moro não aguentou a pressão quando foi convidado a depor sobre a "Vaza-Jato" na Câmara dos Deputados. Se os advogados de Moro trabalharem direitinho, conseguirão esfolar Bolsonaro. 

Ainda há muita tinta para correr nesse inquérito. A ver.


Os três "Brasis"

Grosseiramente, vejo hoje o Brasil dividido entre três grupos. 

Há os bolsonaristas e lulistas, completamente alucinados e delirantes, embriagados por uma mistura de fanatismo, cinismo, comodismo e narcisismo grupal. 

Esmagada entre essas massas fanatizadas e demenciadas, uma estreita minoria de pessoas (minimamente) sensatas, que tentam pensar pela própria cabeça e manter alguma sanidade em meio a tanta demência. E mesmo entre os sensatos há quem flerte com uma ou outra insensatez. 

Faço ainda a ressalva de que, embora se alimentem mutuamente, o fanatismo bolsonarista é muito mais perigoso que o lulista. 

Mesmo em seus piores momentos a militância petista respeita (embora por vezes tensione) os limites do jogo democrático e republicano. A militância bolsonarista, por outro lado, ignora ou despreza esses limites e a ala mais fanática sonha simplesmente com a própria destruição da ordem constitucional. 

Estamos na corda bamba, pulando com um pé só, tentando equilibrar um ovo de avestruz numa colher de café apertada entre os dentes - e não há rede de proteção embaixo...


Povos indígenas, descaso crônico e pandemia

Reflexão da antopóloga Maria Luísa Lucas, que trabalha com a etnia Bora, na Colômbia, e acaba de perder uma amiga indígena na atual pandemia. A reflexão não é pertinente apenas ao contexto colombiano; define bem a situação das populações indígenas em toda parte.

Além das ajudas emergenciais, uma reflexão é necessária.

Essas pessoas não estão morrendo de Covid, elas estão morrendo de anos e anos de falta de assistência de saúde básica. E isso em vários níveis.

Primeiro se vêem obrigadas a viver na cidade, onde não tem a mesma segurança alimentar da aldeia. Não têm trabalho fixo (boa parte dos indígenas em Leticia vive de vender coisas na rua ou como diaristas, pedreiros, etc.).

Têm um sistema de saúde público privatizado nas tais EPS que faz com que as pessoas tenham um acesso muito heterogêneo a coisas básicas como exames e tratamento de diabetes, hipertensão, obesidade, alcoolismo (cada vez mais comum, sem a segurança alimentar)...

E no fim, quando contraem a doença, morrem por não ter leito de hospital, médico, respirador... O mais triste é isso.

É o terceiro indígena que conhecia pessoalmente que morre não só porque a doença é grave, mas principalmente porque não teve assistência médica.

A História não se repete; mas rima...


domingo, 24 de maio de 2020

Brasil - Chega de palhaçada

Eu teria muitos comentários a fazer sobre os acontecimentos do Grande Circo Brasil na última semana. Mas não vou.

"O Brasil não é um país sério" - e ando farto dessa palhaçada.

Há um momento em que o cidadão sensato simplesmente cansa de tanta gente grotesca, com sua grosseria, boçalidade e baixaria.

Há um limite para a paciência.

Por hoje, prefiro estudar sobre os petróglifos do Alto Rio Negro. Antes dedicar minha atenção à arte gravada na pedra que a essas toscas garatujas que, com sorte, as marés do tempo hão de apagar da areia.

Deixo aos palhaços suas palhaçadas. Que riam, se graça houver. A vida é curta demais para se consumir discutindo tolices e eu não paguei para entrar nesse circo.

Ao menos por hoje quero paz.


quarta-feira, 20 de maio de 2020

Gradientes primatas

"O problema é que continuamos presumindo que há um ponto em que nos tornamos humanos. Isso é tão improvável quanto haver um comprimento de onda preciso em que o espectro de cores passa do laranja ao vermelho. A típica proposição de como isso aconteceu é aquela de uma repentina inovação mental - uma centelha milagrosa - que nos fez radicalmente diferentes. Mas se aprendemos algo de mais de 50 anos de pesquisa com chimpanzés e outros animais inteligentes é que o muro entre cognição humana e animal é como um queijo suíço. Excetuando nossa capacidade linguística, nenhuma reivindicação de singularidade sobreviveu sem modificações por mais de uma década. Mencione alguma - uso de ferramentas, fabricação de ferramentas, cultura, partilha de alimentos, teoria da mente, planejamento, empatia, raciocínio inferencial - tudo isso foi observado em primatas silvestres ou, melhor ainda, muitas dessas capacidades foram demonstradas em experimentos cuidadosamente controlados".
Frans de Waal

Conspiração pela ignorância

A ideia de "estudo por estudo", "conhecimento por conhecimento" não vinga no Brasil.

É bem aquele "pragmatismo pedestre" que Sérgio Buarque de Holanda tanto criticava no ethos lusitano. Existe uma piada francesa muito eloquente: "Qual é o maior zoológico da Espanha? Portugal". Sad, but almost true. Saramago tinha alguma razão ao falar em sua "jangada de pedra".

O fato de que outras línguas europeias já tinham dicionários e gramáticas muito bem estruturados no século XV e a língua portuguesa só teve seu primeiro "Vocabulário" (não dicionário) publicado no XVIII por um filho de franceses diz muito sobre nossas raízes. Da mesma maneira, a reforma universitária de Pombal já era obsoleta quando foi realizada. Sempre sob as bênçãos da Santa Madre Igreja Católica Apostólica Romana e do mais que infame Tribunal do Santo Ofício.

No fundo, é o tal "Arcaísmo como Projeto" de que falam João Fragoso e Manolo Florentino num estudo clássico sobre a economia colonial. Em quase todos os aspectos, da educação à ciência, passando pela economia, por tudo, para o bem e para o mal, somos dignos herdeiros da brava gente lusitana, com sua estreiteza de vistas e horizontes - da Lisboa de Eça de Queiroz ao Rio de Lima Barreto, passando pelos sertões de Euclides da Cunha.

Ao Brasil cabem as honras duvidosas de ter sido o maior canavial do mundo, o maior traficante negreiro, a maior mina de ouro, o maior cafezal, o maior seringal, o maior pasto... Êxitos e "êxitos" sempre efêmeros que decantam laboriosamente nossa posição na retaguarda planetária. Agora, ao que tudo indica, somos sérios candidatos a vencer o campeonato pandêmico. É provavelmente por escárnio que nossa bandeira declama ao mundo "Ordem e Progresso" - e até esse pífio slogan  importamos da mais obtusa intelectualidade francesa.

Às vezes parece que somos vítimas de uma multissecular conspiração pela ignorância...

Capa do excelente, embora limitado, "Vocabulário" de Rafael Bluteau.

A NASA realmente descobriu um "universo paralelo"?!

Nos últimos dias viralizou a notícia de que o físico Peter Gorham, da Universidade do Havaí, teria descoberto evidências da existência  de um "universo paralelo" através do experimento ANITA (Antarctic Impulsive Transient Antenna), conduzido na Antártida empregando um balão com equipamentos de radioastronomia.

O assunto vem sendo veiculado em matérias mal redigidas, confusas e sensacionalistas, típicas de jornalismo "científico". Fui pesquisar melhor sobre o assunto, inclusive no site da própria universidade.

Pelo que pude entender e inferir, como leigo curioso, na verdade teria algo a ver com o Teorema de Göddel (que vem recebendo tímidas e ambíguas corroborações empíricas desde os anos 90) - basicamente supondo que o que convencionamos chamar "tempo" seria reversível para partículas subatômicas (como um fenômeno natural e frequente, acontecendo o tempo inteiro).

A notícia parece remeter também a uma discussão recente no campo da cosmologia. A astrofísica sempre trabalhou com a premissa de que o universo seria homogêneo e isotrópico, mas hipóteses e dados recentes sugerem que não só essa premissa é arbitrária como é possível, quiçá provável, que o universo seja heterogêneo e anisotrópico e que a física tal qual a conhecemos nesse cantinho do cosmos talvez não se aplique a todo o universo observável - com muita ênfase na complexa noção de "universo observável", que remete tanto às capacidades quanto às limitações das tecnologias de pesquisa atualmente disponíveis.

Alguns desses paradoxos supostamente obrigariam a uma profunda revisão do corrente modelo-padrão da física e dos dados empíricos coletados ao longo do século XX. O "cenário Big Bang", por sinal, está em vias de cair. Em suma, estamos (ou talvez não) às portas de uma nova revolução copernicana - o que é fascinante.

As menções a "universos paralelos" só figuram na imprensa leiga, remetendo sempre a uma breve e confusa reportagem de 8 de abril do magazine New Scientist (semelhante à brasileira Superinteressante). Ao que tudo indica, o assunto começou a reverberar do nada na imprensa indiana nos últimos dias e viralizou mundo afora.

De concreto, só há sinais de rádio inesperados, que podem ser indícios de um tipo de partículas nunca detectado antes - o que já é, por si, suficientemente instigante. Daí a universos paralelos vai um abismo.

Me lembra o próprio Edwin Hubble, que nunca endossou a teoria do Big Bang, embora originalmente fundamentada em observações dele. Cauteloso, ele sempre enfatizou: "a única coisa que detectei foram desvios para o vermelho".

A pesquisa científica de ponta hoje envolve grandes projetos, com experimentos caríssimos, grandes equipes transdisciplinares e, por vezes, muitos anos de análise meticulosa de dados coletados em um único experimento - mas para o grande público ainda prevalece a imagem do gênio solitário gritando "Eureka!" em seu laboratório

A grande verdade é que somos formiguinhas tentando copreender coisas que nos ultrapassam imensamente.

Para piorar, temos uma educação científica pífia, com pouca ênfase nos complexos aspectos metodológicos da pesquisa, um público ávido por sensacionalismo e mal preparado para digerir esse tipo de informação e uma cobertura jornalística igualmente rasteira.

Não espanta que em plena pandemia se veja gente tão mal informada, acreditando em mil boatos e panaceias.

Entre outras coisas, o COVID-19 veio nos lembrar que Educação científica e jornalismo de qualidade não são luxos, mas questões, literalmente, de vida ou morte.

Finalizo citando a milenar sabedoria do Tao Te Ching:

"Quanto mais falamos no universo,
Menos o compreendemos.
O melhor é auscultá-lo em silêncio".

Ou ainda, como teria dito Sócrates:

"Tudo que sei é que nada sei".

Balão empregado no experimento ANITA.

domingo, 17 de maio de 2020

Brazil - Lost in translation...

Faço muita tradução em caráter informal. 

Há alguns anos participei de um processo seletivo para tradutor em uma editora brasileira. Deram um capítulo de romance em inglês australiano ultracoloquial para traduzir em 24 horas - um verdadeiro tour de force

Acabei não sendo selecionado e mandei um e-mail para a responsável pelo processo seletivo pedindo um feedback. Ela respondeu que, na verdade, minha tradução era a melhor das enviadas, mas "sofisticada demais para o público brasileiro"...

Uma anedota que diz muito sobre nosso mercado editorial e sobre os hábitos de leitura dos brasileiros. 

Fica, no entanto, o dilema: como formar um público "sofisticado" sem lhe oferecer leituras "sofisticadas"?

A Educação de um povo não se dá apenas na escola ou na universidade, mas também nas livrarias, bibliotecas, museus, parques, teatros, rádio,  televisão, imprensa...

A falência da Educação brasileira não é apenas uma questão de estrutura escolar e universitária; é um problema sociocultural muito mais vasto, cujas dimensões são assombrosas.

Educar no Brasil é como cultivar tulipas no deserto...

sábado, 16 de maio de 2020

"Por que não serei candidato a prefeito do Rio"

A versão de Freixo, segundo a newsletter do deputado federal, que assino; cada um interprete como queira:

Olá,
Tudo bem?

Depois das duas catástrofes que se abateram sobre o Brasil, Bolsonaro e a pandemia, não podemos pensar como pensávamos antes, nem agir como agíamos antes.

Estamos enfrentando um dos maiores ataques da nossa história à democracia e à vida dos brasileiros. Bolsonaro se comporta como um aspirante a ditador que usa ilegalmente o cargo mais importante do País para alimentar uma guerra à democracia. Seu projeto de poder autoritário está retirando direitos e destruindo a dignidade do povo brasileiro com uma voracidade inédita.

Diante destes ataques, agravados pela ação genocida do presidente em meio à pandemia, a urgência da luta em defesa da vida e da democracia se impõe como um dever ante a realização dos nossos projetos pessoais. Por isso, decido sacrificar o meu desejo de disputar novamente a prefeitura do Rio de Janeiro para dedicar todos os meus esforços à construção de uma frente ampla que una nacionalmente o campo democrático no enfrentamento ao fascismo.

Não é fácil abrir mão da minha candidatura, tanto do ponto de vista pessoal quanto político. Mas a escolha se faz necessária para que, em vez de cuidar exclusivamente da minha campanha, eu possa trabalhar pela formação dessa aliança nas eleições municipais deste ano, tanto no Rio de Janeiro, cidade tão desigual e assolada pelo crime organizado e pela associação entre milícias e política, quanto em outras capitais do país. Assumo esse compromisso porque entendo que o pleito de 2020 será um passo decisivo para criarmos pontes, acumularmos forças, amadurecermos um novo projeto de Brasil e derrotarmos o bolsonarismo em 2022.

Além de me dedicar a essa articulação nacional em prol da unidade do campo democrático antifascista, seguirei enfrentando as duras, porém necessárias, batalhas que estamos travando no Congresso Nacional, onde obtivemos vitórias relevantes. Nós aprovamos a renda básica emergencial, garantindo R$ 600 para socorrer os brasileiros na crise quando o governo queria pagar apenas R$ 200; barramos a destruição da legislação que impede o acesso indiscriminado de armas e munições e derrotamos a excludente de ilicitude.

Foram conquistas importantes, porém insuficientes, na Câmara dos Deputados contra a agenda autoritária e violenta do governo Bolsonaro. Diante disso, é fundamental a minha permanência nesta trincheira de lutas que se torna ainda mais necessária diante das consequências da aliança entre o centrão e o governo, que passará a ter uma tropa de choque para seu projeto autoritário e genocida.

Não estamos diante de uma eleição como as outras. O desafio diante de nós é a própria sobrevivência das pessoas e da democracia. Não faz nenhum sentido, nesse momento dramático, pensar apenas em nossos projetos pessoais, em nossos partidos, valorizando nossas divergências. Quem for anti-fascista, hoje, é meu irmão, minha irmã. Chegou a hora de termos grandeza: ou demonstramos desprendimento e capacidade de diálogo, já, ou mereceremos o pior julgamento da história, por não nos unirmos para impedir a destruição da democracia e da vida do povo brasileiro.

Abraços,
Marcelo Freixo

Profil de l'historien chez lui à 36 ans

Fotografia digital feita pela esposa durante a quarentena pandêmica (2020).

Que diria Lavater?

Sobre a desistência eleitoral de Freixo

Acabo de receber a notícia de que Marcelo Freixo desistiu de sua candidatura à prefeitura do Rio em 2020.

Sou eleitor de Freixo, mas não me considero militante. Muito pelo contrário, na condição de cidadão, me vejo no dever de criticar rigorosa e abertamente o político que elegi, sempre que julgar necessário. Não boto a mão no fogo por político ou partido algum e não ofereço apoio incondicional a nenhum deles - tenho isso por imperativo republicano e democrático.

Assim sendo, a presente desistência me parece uma ótima notícia.

Em primeiro lugar, porque estou muito satisfeito com sua atuação como deputado federal, tanto pelo modo parcimonioso e sensato com que vem se posicionando nesses tempos de insensatez como em sua atuação na comissão parlamentar que fez a revisão do "Pacote Anticrime", conseguindo remover ou atenuar alguns dos itens mais nocivos da proposta original - uma pequena vitória, mas importante nesse contexto. Mais uma vez Freixo provou sua eficácia em dialogar e articular, mesmo em condições desvantajosas - um bom exemplo da política enquanto "arte do possível". Considero útil que ele permaneça no Congresso.

De resto, a ideia de uma terceira candidatura como prefeito nunca me agradou. Me parecia um grave erro de cálculo político, pois o contexto ser-lhe-ia muito desfavorável e a experiência pouco agregaria à sua carreira pública.

A situação ficou ainda pior quando começou a se alinhavar uma coligação com o PT, trazendo Benedita como vice. Tanto PT quanto Benedita possuem elevados índices de rejeição - sem contar com o passado de Benedita como vice de Garotinho e sua lastimável atuação no período em que assumiu o governo do Rio. Em tais condições eu sequer votaria em Freixo num eventual primeiro turno.

Semelhante candidatura seria erro comparável ao que foi a atropelada articulação da candidatura de Boulos à presidência em 2018, um grave equívoco, a meu ver, como já apontei em outras oportunidades.

Todavia, há que se refletir sobre as circunstâncias da desistência em questão. Segundo soube, Freixo recuou diante da resistência de setores do PSOL (partido muito fragmentado, como se sabe) em fazer semelhante aliança. A candidatura de Boulos também gerara grande atrito interno no partido.

Por um lado, fica patente o equívoco daqueles que teimam, por ignorância ou malícia,  em rotular o PSOL como "puxadinho do PT". Muito pelo contrário, o PSOL se formou como dissidência justamente no momento em que se realizava a tão sonhada eleição de Lula, diante dos desacertos que se desenhavam ainda no primeiro mandato petista. O PSOL se constituía então como crítica aos temerários "pactos de governabilidade" e ao crescente fisiologismo da burocracia petista.

Durante todo o período do PT na presidência o PSOL se apresentava como "oposição de esquerda", nunca integrou a base governista ou fez coligação eleitoral com o PT. Muito pelo contrário, o PSOL era constantemente acusado por petistas e simpatizantes de ser "a esquerda que a direita gosta". Nesse sentido, é muito emblemática a trajetória de Chico Alencar no PSOL.

Essa postura só começou a mudar em setores do PSOL a partir do impeachment de Dilma e da crescente polarização política que então se acentuava. Nesse clima de "nós contra eles" uma perigosa aproximação começou a se esboçar e se reforçou ainda mais nas acaloradas eleições de 2018. Aproximação perigosa tanto pela força do antipetismo quanto pela tendência da burocracia e da militância petistas em desejar vassalos, e não aliados.

Concluindo, a notícia de hoje me satisfaz por saber que ainda resta algum vigor e brio dentro do PSOL, mas me entristece saber que Freixo tomou essa decisão mais por pressão partidária que por iniciativa própria.

Enfim, torço para que Freixo continue em sua excelente atuação parlamentar e espero que este seja o ponto final desse inapropriado e embaraçoso flerte com o PT.

quinta-feira, 14 de maio de 2020

Das alternativas a Bolsonaro

"Todo mundo fala em derrubar o Bolsonaro, mas para fazer o que exatamente? Para voltar o lulismo? Para voltar aquela política de ampla conciliação de classes da esquerda petista? Para voltar a aquelas alianças com as forças do atraso? As forças democráticas têm que apresentar um programa que seduza a população. A população hoje está aí encurralada com a pandemia, mas mesmo assim é impressionante como Bolsonaro mantém 30% de apoio da população. Você tem que apresentar uma alternativa. Tudo bem, é preciso denunciar o Bolsonaro, mas o que é que a gente tem a dizer de novo, de alternativo?"
Daniel Aarão Reis, em excelente entrevista


quarta-feira, 13 de maio de 2020

“Now we must redefine tool, redefine Man, or accept chimpanzees as humans.”

Louis Leakey sobre as primeiras observações de uso de ferramentas por chimpanzés, realizadas por Jane Goodall

sábado, 9 de maio de 2020

O "Fenômeno Bolsonaro" - Mais complexo que parece

Breves comentários sobre a análise de um sociólogo acerca da eleição de Bolsonaro - que seria, segundo o autor, uma expressão do racismo, machismo e homofobia recalcados (sensu Freud) do "brasileiro médio".

Achei o texto interessante sob alguns aspectos, mas ao mesmo tempo acho que faz algumas generalizações bastante problemáticas, a começar pela ideia de "brasileiro médio" - que não existe. Abordagens centradas no "fulano médio" tendem sempre ao abstrato e nos afastam da realidade. O "Fenômeno Bolsonaro" me parece muito mais complexo que isso. 

Além disso, o autor faz uma análise estática demais para meu gosto. Há que se explorar com muito mais detalhes as dinâmicas políticas, sociais, econômicas e culturais brasileiras nos últimos 30 ou 20 anos para compreender melhor isso.

Não me parece que tudo se resuma a essa "psicologia de massas" pseudo-freudiana. Do ponto de vista cultural, há que se levar em conta a convergência de paternalismo e messianismo, sempre latente em nossa cultura política, que vez por outra é captada por algum político carismático (Vargas e Lula são apenas 2 exemplos disso). 

Também há que se tomar em consideração o projeto lulista de inclusão social via consumo, que entrou em colapso junto com a economia em 2014, gerando uma tremenda onda de frustração entre seus próprios beneficiários. Muitas pessoas cujos padrões de vida haviam melhorado, tant bien que mal, durante as primeiras gestões do PT se ressentiram profundamente da recessão econômica cujos sinais começaram a se anunciar ainda no primeiro mandato de Dilma. A estagnação ou piora dos padrões de consumo da "nova classe média" alimentaram uma onda de insatisfação popular que viabilizou o impeachment de 2016 e a ânsia por um novo "salvador da pátria".

Também precisa se levar em conta a irresponsabilidade política de PT, PSDB e PMDB, cujas lutas eleitoreiras e dúbios pactos de governabilidade conduziram tanto ao descrédito da democracia constitucional quanto à aguda polarização política - fenômenos que, ambos, geraram o vácuo de poder e o ambiente venenoso onde o bolsonarismo pôde prosperar. O impacto da Lava-Jato sobre o imaginário político tampouco pode ser menosprezado. 

O mesmo se diga dos bizarros desdobramentos de 2013, que começou como um movimento da esquerda "bastarda" (desacreditada pelo PT e opositora de alguns de seus aliados, como Sérgio Cabral), e acabou gerando subprodutos como MBL e congêneres - militâncias digitais ultraliberais ou ultraconservadoras que se fortaleceram com a mobilização pró-impeachment de 2016. Entre as "Jornadas de Junho" de 2013 e a controversa Copa de 2014 nasceram as militâncias com camisas da CBF e bandeira nacional cujo beneficiário inicial foi Aécio Neves nas eleições de 2014, mas foram posteriormente cooptadas por Bolsonaro.

Também se faz necessário pensar na explosão neopentecostal dos anos 80 e 90 e seus desdobramentos políticos, em boa medida encorajados pelo PT (Magno Malta - "fiel" apoiador de Lula, Dilma, Temer e, finalmente, Bolsonaro - é uma figura muito emblemática, nesse sentido). O PT apoiou partidos e lideranças evangélicas de credenciais mais que dúbias durante anos, alimentando outro dos afluentes que finalmente desembocou no amplo apoio a Bolsonaro por parte de organizações religiosas politicamente aparelhadas e formadoras de um eleitorado fiel às orientações, explícitas ou veladas, vindas do púlpito.

O lamentável episódio do atentado em Juiz de Fora também não pode ser menosprezado - muita gente se alinhou a Bolsonaro na esteira da comoção gerada pela facada. Vi mais de uma pessoa se convencer a votar em Bolsonaro por acreditar que a facada era uma desesperada tentativa do "istablichem" de matar o único homem incorruptível que podia ameaçá-lo. Para muitos, a facada converteu Bolsonaro numa espécie de "mártir da Pátria". Por sinal, o episódio sempre é lembrado pelo séquito presidencial em momentos de crise, reativando e mobilizando essa memória conforme as necessidades e conveniências.

Em suma, o tema é muito complexo; a esquerda precisa encarar a realidade e parar de requentar as velhas teses (em parte verdadeiras) de que tudo se resume a uma reação da dita "classe mérdia" racista, machista, homofóbica e "pobrofóbica" que não aceitou ver pobre em aeroporto, negro na universidade etc. Essas pessoas e atitudes existem, mas acho um equívoco dizer que esse seria o "brasileiro médio" e que o "Fenômeno Bolsonaro" seria mero reflexo disso.

Nossa paisagem política sempre tende mais às engenhosas ilusões de Escher que à pureza neoclássica.

"Dia e Noite" (1938), de Escher

Crossover: "Barão de Itararé encontra o Surfista Prateado!"



Trechos da HQ "Parábola", estrelada pelo Surfista Prateado, escrita por Stan Lee e desenhada por Moebius.
Dedico essa estranha colagem aos amigos Ana Delmas e Roger Marques, que me enviaram respectivamente a citação e os quadrinhos.

quarta-feira, 6 de maio de 2020

Roman way of life

Trecho de um curiosa - e um tanto grotesca - matéria do interessantíssimo site Sapiens.

"Ao que podemos deduzir dos dados históricos e arqueológicos, os antigos romanos urinavam em pequenos jarros em suas casas, escritórios e lojas. Quando esses pequenos jarros ficavam cheios, eles os vertiam em grandes jarros na rua. Assim como com seu lixo, uma equipe vinha uma vez por semana para coletar aqueles pesados jarros de urina e leva-los à lavanderia. Por quê? Porque os antigos romanos lavavam suas togas e túnicas em urina! A urina humana é rica em amônia e outros químicos que são excelentes detergentes naturais. Se você trabalhasse em uma lavanderia romana, seu trabalho seria pisar em roupas o dia inteiro - descalço e afundado até o tornozelo em colossais bacias de urina humana".

"Me engana, que eu gosto"


segunda-feira, 4 de maio de 2020

"Nintendo - Finalmente no Brasil"

Me recordo que o "lançamento" de Starfox no Brasil foi num anúncio bem longo num domingo, durante o Fantástico - anúncio este antecipado por inúmeros teasers durante a semana. 

Eu tinha 8 ou 9 anos à época e me recordo de ter ficado "siderado" pelos então impressionantes gráficos 3D. Nunca tive oportunidade de jogar o game - apenas sua sequência infinitamente melhor para o N64 - mas o anúncio me marcou indelevelmente. Era, com efeito, o arauto de uma nova era.

Era a época áurea das revistas de games, que lotavam as bancas e juntavam a garotada no pátio de minha escola ou nas calçadas de minha vila. Hoje, graças à Internet, os títulos são raros, e as tiragens, minúsculas.

Outros tempos.

Revista do acervo pessoal do amigo Roger Marques.

sexta-feira, 1 de maio de 2020

Ruy Fausto - Uma perda

Acabo de receber a notícia de que hoje perdemos um grande acadêmico e intelectual brasileiro, o filósofo Ruy Fausto, aos 85 anos.

Nos últimos dois anos mantivemos correspondência por e-mail e tive oportunidade de vê-lo pessoalmente uma vez.

Para além da impressionante erudição e da argúcia intelectual patentes em seus escritos, era um cavalheiro muito cortês, cordial, afável e espirituoso.

Em tempos de polarização e fanatismo, Ruy era uma das poucas vozes lúcidas, sensatas e críticas na esquerda brasileira.

Ruy nos deixa de forma muito poética, tocando piano em sua casa, no Dia dos Trabalhadores.

Que seu legado se mantenha vivo entre nós e que as sementes que plantou possam germinar, florescer e frutificar.