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quarta-feira, 24 de junho de 2020

Getúlio Vargas e o Brasil na II Guerra Mundial

Extratos do livro Uma História do Brasil, de Thomas Skidmore

Em torno de 1934, o tipo de confronto geopolítico europeu já estava se tornando claro. A Alemanha nazista tinha seus olhos não apenas em seus vizinhos europeus, mas também sobre a crescente influência no Hemisfério Ocidental. Ela identificava o Brasil como um importante parceiro comercial e começava a exercer influência sobre essa relação bilateral, por meio de um mecanismo que consistia numa moeda alemã especial usada para pagar pelas exportações brasileiras, que podia ser resgatada apenas pela compra de exportações alemãs, criando uma forma de comércio amarrado. [...] Entretanto, os alemães estavam interessados em mais do que comércio. Eles também queriam atrair o Brasil para a sua esfera político-militar, e cultivavam sistematicamente a amizade com oficiais do Exército brasileiro, conhecidos como admiradores da destreza militar alemã, bem como ofereciam ao Brasil armas e treinamento técnico. Do mesmo modo que no período pré-Primeira Guerra Mundial, o governo dos EUA preocupava-se com essa estratégia alemã, tendo o Departamento de Estado denunciado a política comercial alemã como discriminatória. Os militares americanos tentaram agir contra as ofertas alemãs de armas e treinamento, mas fracassaram neste esforço. Getúlio havia tentado obter equipamento militar americano antes, mas o Congresso dos EUA, um corpo bastante isolacionista durante a década de 1930, proibira a venda de armas no exterior pelos Estados Unidos.

[...]

A opinião pública brasileira era o alvo em uma batalha sobre que lado apoiar na guerra que se aproximava na Europa. O sentimento da elite favorecia fortemente os Aliados por razões culturais, e, até sua supressão em 1935, os comunistas também haviam sido eficazes em promover opiniões antinazistas. Mas alguns brasileiros, como em 1914, eram favoráveis à Alemanha, não obstante os laços culturais históricos.

Getúlio mostrava-se inclinado a procurar os Estados Unidos para laços militares, tentando, como já citamos, comprar armas deles antes de se voltar para a Alemanha. Em 1937 ele também oferecera ao presidente Roosevelt o uso de bases litorâneas no Brasil, oferta esta que foi recusada, presumivelmente porque Roosevelt não podia permitir-se contrariar o Congresso isolacionista, dando a impressão que se preparava para a guerra. E uma oferta brasileira de comprar destroieres excedentes dos EUA foi igualmente recusada quando as autoridades americanas cederam aos protestos da Argentina contra a venda. Quando a guerra finalmente eclodiu em 1939, Getúlio e seus generais, lembrando essas rejeições, preferiram permanecer neutros até que os Estados Unidos estivessem preparados para pagar um preço justo pelo apoio brasileiro. Além disso, os brasileiros continuavam a cultivar relações com as potências do Eixo como parte do jogo de usá-las contra os Estados Unidos.

O Brasil não declarou guerra até meados de 1942, quando os que estavam em cima do muro puderam ver que a sorte militar havia virado para o lados dos Aliados. A invasão da Rússia em 1941 havia apanhado a Wermacht em um feroz inverno russo, e os submarinos alemães sofriam pesadas perdas na batalha do Atlântico. O Brasil não podia esperar mais se pretendia obter alguma compensação atraente por entrar na guerra.

O Brasil tinha ao menos dois trunfos de que os Aliados precisavam. Um era matéria-prima, incluindo borracha natural, quartzo (essencial para comunicações por rádio) e outros minerais. O outro era seu litoral, que oferecia bases aéreas e marítimas em pontos estratégicos no Oceano Atlântico. Getúlio conseguiu um acordo atraente, pelo qual o país concordava em fornecer a matéria-prima e as bases aos EUA, apenas em troca de equipamento militar, assistência técnica e financiamento para uma usina siderúrgica brasileira (localizada em Volta Redonda). Essa aliança fez do Brasil o mais evidente parceiro latino-americano dos Estados Unidos na guerra. Além disso, estabelecia precedente para o apoio do governo americano à industrialização de base em um país do Terceiro Mundo.

Em 1941 Getúlio começou a mover-se em direção aos Aliados ao aprovar um projeto da Pan American Airways (sob contrato do exército dos EUA) para modernizar aeroportos no Norte e Nordeste. Em janeiro de 1942, na conferência do Rio de Janeiro, onde o apoio latino-americano para a entrada na guerra agora prevalecia, graças ao ataque japonês a Pearl Harbor, o Brasil rompeu ostensivamente com o Eixo. O ingresso do Brasil na guerra tinha uma importante implicação para a política interna. A decisão de unir-se às democracias era um golpe contra os autoritaristas que alegavam que a democracia não tinha lugar no Brasil, e supunham que Getúlio concordava com eles. Este e seus generais, ao questionarem essa suposição, estavam montando o cenário para um debate que iria terminar com o fim da ditadura getulista.

Com a entrada do Brasil na guerra, uma onda de funcionários norte-americanos, tanto militares como civis, veio ao Brasil. [...] Em 1943, brasileiros e norte-americanos construíram uma rede de modernas bases militares aéreas e marítimas no litoral do Nordeste.

Junto com a ofensiva militar dos EUA no Brasil veio uma ofensiva cultural. O presidente Roosevelt designou o multimilionário Nelson Rockefeller para dirigir um novo escritório cujo objetivo era promover a melhoria das relações culturais com a América Latina, tendo o Brasil como alvo principal. O escritório de Rockefeller recrutou talentos como Orson Welles e Walt Disney para fazerem filmes voltados ao fortalecimento da opinião pró-EUA.

[...]

Por trás dessas atividades jaziam objetivos d elongo prazo dos EUA: sendo um deles o aumento de sua penetração econômica no país. Embora o investimento norte-americano no Brasil já superasse o investimento britânico, investidores norte-americanos ansiavam por novos progressos. [...] A colaboração durante a guerra oferecia uma base excelente para a ofensiva econômica norte-americana posterior. Aviões norte-americanos passaram a dominar não apenas o uso militar, mas também o civil.

[...]

O desejo de Getúlio de identificar o Brasil com a causa dos Aliados levou-o a oferecer três divisões do Exército brasileiro, cujos oficiais se entusiasmaram com a ideia, para combater os alemães no cenário de guerra do Mediterrâneo. Getúlio tinha dois importantes propósitos ao insistir no papel militar brasileiro: um era enfatizar a posição do Brasil como único país latino-americano a enviar forças terrestres sob sua própria bandeira para a guerra [...]; e o segundo era despertar o orgulho brasileiro e dar ao público uma razão patriótica para apoiar o governo.

Para enfatizar que se tratava de um esforço nacional, Getúlio queria efetivos recrutados por todo o país e insistiu para que todo estado fosse representado, independentemente da qualidade dos recrutas locais. A força resultante era altamente heterogênea, carecendo de treinamento comum e desprovida por completo de experiência de combate. [...] Os comandantes [brasileiros] esperavam combater na África do Norte, portanto as tropas receberam uniformes de verão, mas a Força Expedicionária Brasileira, ou FEB, foi designada para operar com o Quinto Exército dos EUA, que combatia contra a renhida defesa alemã em terrenos montanhosos ao norte de Roma, exatamente quando se iniciava um rigoroso inverno. Os brasileiros foram lançados à batalha com a missão de escalar um precipício no qual os alemães estavam com os canhões em posição dominante. Apanhados no fogo cerrado, sofreram pesadas baixas e retiraram-se desordenadamente.

Embora difícil de surpreender, [...] o fracasso nesse primeiro combate foi extremamente perturbador para os comandantes brasileiros, que recorreram aos norte-americanos para ajuda e orientação. As tropas nacionais passaram por rápido retreinamento e logo retornaram ao combate. Seu desempenho foi significativamente melhor, e eles ajudaram a capturar Monte Cassino, o monastério histórico que assinalava a principal posição alemã. O registro do combate brasileiro na Itália tornou-se ulteriormente objeto de amarga controvérsia: os relatos oficiais enfatizavam o autêntico heroísmo depois do retreinamento, mas os críticos (incluindo alguns oficiais brasileiros) enfatizavam o fracasso inicial pelo qual eles injustamente culpavam comandantes incompetentes.

O engajamento do Brasil no combate deixou um legado significativo. Primeiro, forneceu uma base para a reivindicação do país de um papel importante no pós-guerra [...]. Segundo, o envio da força expedicionária aumentou imensamente o prestígio do Exército brasileiro. Como os únicos latino-americanos a terem lutado na Europa, os brasileiros podiam manter a cabeça erguida entre os Aliados. Terceiro, o combate conjunto na Itália fortaleceu os laços entre os militares norte-americanos e brasileiros, mesmo considerando-se que o Brasil permanecia claramente como o sócio menor.

Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial, Rio de Janeiro

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