Extrato do livro L`Anthropologie face aux problèmes du monde moderne, de Claude Lévi-Strauss
"Há dois ou três séculos, a civilização ocidental se dedicou principalmente ao conhecimento científico e suas aplicações. Se adotarmos esse critério, faremos da quantidade de energia disponível per capita o índice do grau de desenvolvimento das sociedades humanas. Se o critério fosse a aptidão para triunfar sobre meios geográficos particularmente hostis, os Esquimós e os Beduínos levariam os louros. A Índia soube melhor que nenhuma outra civilização elaborar um sistema filosófico e religioso capaz de reduzir os riscos psicológicos de um desequilíbrio demográfico. O Islã formulou uma teoria da solidariedade de todas as formas de atividade humana: técnica, econômica, social e espiritual, e sabem que lugar proeminente essa visão do homem e do mundo permitiu aos árabes ocupar na vida intelectual da Idade Média. O Oriente e o Extremo-Oriente possuem sobre o Ocidente uma dianteira de vários milênios em tudo que diz respeito às relações entre o físico e o moral, e à utilização dos recursos dessa suprema máquina que é o corpo humano. Atrasados nos planos técnico e econômico, os [aborígenes] Australianos elaboraram sistemas sociais e familiares de tão grande complexidade que para compreendê-los é necessário apelar a certas formas da matemática moderna. Podemos neles reconhecer os primeiros teóricos do parentesco.
A contribuição da África é mais complexa, mas também mais obscura, pois nós apenas começamos a compreender o papel de melting pot que ela desenvolveu no Mundo Antigo. A civilização egípcia é inteligível apenas como obra comum da Ásia e da África. E os grandes sistemas políticos da África antiga, suas contribuições jurídicas, seu pensamento filosófico durante muito tempo oculto aos ocidentais, suas artes plásticas e sua música são outros tantos aspectos de um passado muito fértil. Pensemos enfim nas múltiplas contribuições da América precolombiana à cultura material do Velho Mundo. Em primeiro lugar, a batata, a borracha, o tabaco [sic] e a coca (base da anestesia moderna), que, a diversos títulos, constituem quatro pilares da civilização ocidental; o milho e o amendoim, que revolucionaram a economia africana antes mesmo de serem conhecidos na Europa e, para o milho, de lá se espalhar; em seguida, o cacau, a baunilha, o tomate, o abacaxi, a pimenta, várias espécies de feijões, algodões e cucurbitáceas. Enfim, o zero, base da aritmética e, indiretamente, da matemática moderna, era conhecido e utilizado pelos maias ao menos meio milênio antes de sua descoberta pelos índios que o transmitiram à Europa por intermediação dos árabes. Por essa razão, talvez, o calendário maia era, em época igual, mais exato que aquele do Velho Mundo".
quarta-feira, 29 de julho de 2015
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