Como funcionam as
Fábricas de Cultura?
As Fábricas de Cultura são administradas pela Organização
Social Catavento Cultural e Educacional e funcionam a partir de uma política
pública do Estado de São Paulo. Elas estão localizadas em pontos estratégicos
das periferias de São Paulo - há uma em São Bernardo do Campo e recentemente foi
inaugurada outra na cidade de Santos. Este ambiente fornece cursos voltados
para a formação artística - entre eles posso citar Balé, Street Dance,
Circo, Capoeira, Violão, Violino,
Percussão e muitos outros. O maior foco é para crianças e adolescentes, entretanto,
há cursos para adultos e para o pessoal da terceira idade. Não há custo nenhum de
mensalidade, nem de matrícula. Além disso, são fornecidos instrumentos para os
aprendizes e um lanche. As aulas duram três horas e são realizadas duas vezes
por semana para as crianças e adolescentes; há aulas em um número menor
direcionadas ao público adulto no período noturno e aos sábados. O espaço também
dispõe de biblioteca, teatro e promove diversos eventos. Ao pensar na
Fábrica de Cultura penso em um grande polo cultural de ensino. E não posso
deixar de mencionar que as Fábricas estão passando por um processo de
atualização e irão fornecer cada vez mais cursos nas áreas de
tecnologia.
Como você avalia o
impacto das Fábricas de Cultura na vida do público participante? Você poderia
citar algum caso que marcou você, nesse sentido?
O público adota as Fábricas como lar. Converso com os
funcionários mais antigos da casa e a frase que mais ouço é "Eu vi essa menina
e esse menino crescerem". Há o ensino das artes e o envolvimento cultural através
de atividades realizadas na biblioteca e pelos ateliês de ensino e isso é
maravilhoso. Porém, tenho que destacar o impacto social e a construção da
cidadania. Os alunos fazem amizades, desenvolvem a empatia e passam a possuir
um olhar diferenciado sobre a sociedade que os cerca. Converso com os
aprendizes e é incrível como eles possuem uma visão aberta. Eles enxergam o
bairro ao redor deles, mas também a cidade e o país como um todo. Até os sonhos
deles são grandes. Vejo que a Fábrica de Cultura conseguiu se inserir nas
periferias e demonstrar que mudanças e uma vida melhor são possíveis.
Todo dia tem um caso marcante. Já ouvi criança de oito anos
com um brilho nos olhos dizendo que quer ser advogada e pedindo livros; um
garoto tocando como um profissional e com os trejeitos de um guitarrista; uma
garotinha com uma necessidade especial feliz por poder jogar capoeira; um
aprendiz que saiu da fábrica e hoje se apresenta na Europa; as mães e pais
orgulhosos ao ver uma apresentação; um garoto interessado no Balé, meninas
querendo jogar xadrez e os abraços de aprendizes que não tem medo de demonstrar
amor e acabam encontrando um belo caminho para serem felizes. Tudo isso é
marcante.
Qual é a sua história
com o programa? O que significa, para você, trabalhar na Fábrica de Cultura?
Antes de trabalhar na Fábrica a minha relação era de
expectador. Ao começar, a minha vida mudou. Sou muito grato por poder fornecer
educação, reflexão e entretenimento para as pessoas. Como em qualquer trabalho, existem não só os números como também as metas. Elas são alcançadas junto com a
satisfação de ver vidas sendo mudadas. Perco a conta das crianças que entram só
para usar o computador e um tempo depois fazem amizades, se interessam pelos
cursos, pegam livros emprestados e... elas simplesmente se soltam. Nada mais
recompensador que ver pessoas leves e livres. Até mesmo eu sinto-me assim. Perdi
muito da minha timidez, conheci novas artes e, principalmente, vejo esperança.
Estive muito tempo esperando uma grande revolução gerada a partir de redes
sociais. Hoje, ao ver a mudança florescer aos poucos no mundo real, sinto-me
feliz com o meu andamento profissional e pessoal - lidar com esperança me deixou
mais leve para lidar comigo mesmo e com os outros.
Na sua opinião, que
lições o programa pode oferecer para se pensar as políticas públicas de Cultura
no Brasil? Que contribuição iniciativas como as "Fábricas de Cultura"
podem oferecer não apenas a seu público alvo, mas à sociedade brasileira, como
um todo?
Primeiramente, o programa já quebra muitos estereótipos de
que o brasileiro não gosta de arte; de que na periferia nada vai para frente e
de que o brasileiro não tem jeito. A Fábrica de Cultura forma cidadãos que
estão interessados em atuar na sociedade, ter uma profissão e exigir direitos enquanto
tem a plena noção de quais são os seus deveres. É um local perfeito para
complementar os estudos da escola. Aliás, vendo a Fábrica atuar, eu penso em
como a escola pode ser diferente. Arte deve ser parte importante na formação do
jovem: estimula a empatia, ensina sobre responsabilidade e melhora a
interpretação da realidade a sua volta.
Acredito que a Fábrica como um todo pode ensinar a importância da arte na
formação do jovem, do adulto e do idoso. Também pode ensinar sobre empatia;
acreditar em sonhos e a não só respeitar como também exigir melhorias no
bairro, na cidade e no país. Um local que acolhe, ensina e diverte provoca
apego. Tendo essa relação estabelecida, o cuidado para com ele será consequência.
Sonho que este apego seja multiplicado para as escolas, hospitais, tribunais,
transporte público e outros setores vitais para a sociedade.
Agradeço por me dar a oportunidade de falar de um local que
gosto tanto!
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