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domingo, 17 de julho de 2016

Pessoas de juízo não se fecham no guarda-roupa!

"Pedro segurou a porta encostada, mas não a fechou completamente: como todas as pessoas de juízo, sabia muito bem que nunca devemos nos fechar dentro de um guarda-roupa".

Estou lendo O leão, a feiticeira e o guarda-roupa, de As Crônicas de Nárnia, de C.S. Lewis; a obra dispensa maiores apresentações. Curiosamente, o preceito acima é enunciado várias vezes durante a primeira parte do livro, antes que as crianças se percam definitivamente no mundo escondido no guarda-roupa. O curioso preceito aparece pela primeira vez quando a pequena Lúcia encontra o guarda-roupa:

"Não fechou a porta, naturalmente: sabia muito bem que seria uma tolice fechar-se dentro de um guarda-roupa".

O que me despertou a atenção foi que, eu mesmo, quando criança, ouvi muitas vezes esse mesmo conselho. Meu avô e, principalmente, minha avó sempre repetiam que era muito perigoso se fechar no guarda-roupa, pois poderia vir alguém e passar a chave no armário; os gritos abafados da criança (como eu) não seriam ouvidos e ela poderia morrer sufocada!

Minha família tinha mesmo uma (quase) dramática história cautelar sobre o tópico: meu avô tinha dois primos muito levados, que certa vez se esconderam no armário. Em casa estavam apenas duas tias-avós idosas e ligeiramente surdas. Os dois garotos se puseram a berrar pedindo socorro, mas as duas não ouviam, tomando placidamente um chá. Finalmente, um parente mais jovem chegou em casa e ouviu os gritos dos meninos. Segundo minha avó (que nem pertencia a esse ramo da família), os garotos já estavam vermelhos quando foram resgatados - podiam ter morrido!

Cresci ouvindo essa história e esse conselho; algumas vezes cheguei a me esconder em armários (a tentação era grande), mas, por via das dúvidas, nunca fechava a porta! Para mim, morrer sufocado num armário era um risco palpável.

Acho que poucas crianças morreram sufocadas em armários - if any. Ao que parece, todavia, o medo desse improvável evento era comum, não apenas no Brasil de minhas avós, mas também na Inglaterra de Lewis. A crer nas Crônicas de Nárnia, as crianças inglesas dos anos 50 e de gerações anteriores também eram cuidadosamente advertidas contra esse "grave perigo".

Por outro lado, isso me leva a pensar que esconder-se em armários talvez tenha sido sempre tentador para as crianças. De fato, até hoje, alguns alunos meus brincam de se esconder nos armários da escola que eventualmente encontram destrancados. Talvez Freud encontrasse aí um desejo de refúgio uterino ou coisa do gênero...

Me pergunto se esse medo inexplicável teria algo a ver com a arquitetura dos armários antigos: a madeira era muito sólida e as portas costumavam ter chaves. Eu mesmo convivi com um monstro desses no quarto de meus avós. De lá para cá os armários se tornaram frágeis cascas de madeira laminada e me parece que armários com fechadura são cada vez menos comuns - dificilmente confundíveis com os devoradores de crianças travessas de outrora.

Retornando à obra de Lewis, me indago se essa cultura de alerta contra os perigos dos guarda-roupas, tão reiterada pelo próprio autor, de alguma forma inspirou-o a colocar dentro de um armário as portas para o mundo perigoso e encantador de Nárnia, situado entre as aventuras das crianças e os temores dos adultos. Quem sabe?!

P.S.: Lendo o texto, minha esposa se recordou que também minha sogra a advertia para não se fechar em armários!

3 comentários:

Thais disse...

Isso foi bem explicativo.

Thais disse...

Obrigada! :)

Anônimo disse...

Eu não fazia ideia q corria risco de morrer sufocana me trancando em um guarda-roupa;---;