Na última semana estive na Place de la Bastille. Como se sabe, a fortaleza foi destruída durante a Revolução Francesa. Hoje restam apenas as pedras que marcam o contorno da construção. Apenas uma placa comemorativa explicita esses vestígios, por sinal difíceis de distinguir com todo o trânsito da praça. Não fossem essas lembranças, pareceriam apenas pedras comuns no chão...
Ao lado, outra placa, em agradecimento "a nossos pais de 1789", dedicada pelos "estudantes de 1880".
É difícil definir a sensação de estranheza experimentada num lugar que ao mesmo tempo foi, simbolicamente, o epicentro da contemporaneidade, o ponto de partida do estranho mundo em que vivemos hoje, mas que não guarda muitas lembranças visíveis do que era a Bastilha em 1789, à ocasião daquele fatídico 14 de julho.
Por estranho que pareça, o que se sente ali é uma ausência incomensuravelmente densa, como um objeto invisível mas poderoso, um centro gravitacional que só pode ser percebido por seus efeitos; como um buraco negro, talvez, ou como uma radiação de fundo. É como se a Bastilha destroçada nunca tivesse deixado de estar ali; mais complexo ainda, é como se ela só exista significativamente exatamente porque deixou de existir. Um paradoxo: ela só está ali porque não está ali.
Como uma espécie de "matéria escura", uma massa colossal de simbolismo invisível, que faz gravitacionar a seu redor inúmeros outros monumentos significativamente ligados direta ou indiretamente à própria Revolução, como a Torre Eiffel (comemorativa do centenário), o Arco do Triunfo (marcando as vitórias do exército revolucionário), entre tantos outros (Invalides, Conciergerie, etc).
De fato, talvez seja tão importante porque sua ausência represente a posteriori a própria "destruição" do Antigo Regime. De qualquer forma, me parece inevitável que a Bastilha perdeu sua existência material apenas para adquirir um outro tipo de existência muito mais poderosa, onipresente e incontornável: a existência simbólica. Tornou-se um monumento tecido de ausência.
2 comentários:
Muito bom!
Me lembrou uma frase interessantíssima do personagem V do "V for Vendetta" do Alan Moore.
Quando ele defende a importância da destruição do prédio do Parlamento afirmando que O prédio era um símbolo assim como o ato de destruí-lo.
Postar um comentário