Newsletter

Sua assinatura não pôde ser validada.
Você fez sua assinatura com sucesso.

Oficina de Clio - Newsletter

Inscreva-se na newsletter para receber em seu e-mail as novidades da Oficina de Clio!

Nous utilisons Sendinblue en tant que plateforme marketing. En soumettant ce formulaire, vous reconnaissez que les informations que vous allez fournir seront transmises à Sendinblue en sa qualité de processeur de données; et ce conformément à ses conditions générales d'utilisation.

quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Paulo Guedes e o "dilema liberal"

Inflação e hiper-inflação são fenômenos econômicos muito complexos, mas o Liberalismo ortodoxo se apega a explicações muito simplórias.

Segundo o catecismo do Liberalismo Econômico ortodoxo e, mais fortemente, do Neoliberalismo, a culpa da inflação costuma ser atribuída ao governo, especialmente pela emissão de moeda. A "mão invisível" do mercado, por outro lado, seria uma força inerentemente benigna, capaz de alcançar espontaneamente o "preço ótimo" dos produtos e serviços. Nessa visão simplista e reducionista, quase platônica, o Estado seria responsável por todas as mazelas econômicas, por impedir o Mercado de agir livremente.

Na vida real, no entanto, as coisas são muito mais complexas. Embora o Estado seja um agente econômico de imensa importância, há inúmeros outros agentes envolvidos sob o rótulo reificado de "Mercado" - bancos, indústria, comerciantes, agroprodutores, consumidores, entre outros. Parodiando Margaret Thatcher, "there is not such a thing as 'the market'".

No caso específico das dinâmicas inflacionárias, a emissão de moeda certamente pode ser um fator inflacionário, mas está longe de ser o único. A concessão desenfreada de crédito por instituições financeiras, flutuação cambial, bolhas especulativas e outros fatores, isoladamente ou em conjunto, podem contribuir para crises inflacionárias. 

No Brasil, atualmente, estamos vivendo um processo inflacionário agudo, que tem atingido principalmente (mas não apenas) o mercado de alimentos, vulnerabilizando as condições de subsistência dos setores de baixa renda da população brasileira.

Em boa medida isso se deve à desvalorização acentuada do Real no plano cambial, o que tem levado o agronegócio a preferir exportar produtos a abastecer o mercado interno, devido às perspectivas de lucro mais atraentes. Em outros países, especialmente na Europa, há mecanismos legais para impedir esse tipo de situação, visando a segurança alimentar da população. Aqui, tais mecanismos não existem. O abastecimento interno do Brasil depende majoritariamente dos interesses do "Mercado" - interesses fundamentalmente baseados no lucro, deixando considerações humanitárias à margem.

Em circunstâncias normais, boa parte dos economistas liberais brasileiros a essa altura explicaria os problemas recorrendo aos velhos chavões, possivelmente clamando por políticas de austeridade (a grande panaceia liberal nas últimas décadas).

A grande ironia é que agora temos  um ultraliberal ortodoxo como "superministro" da economia, seguindo rigorosamente as recomendações do liberalismo "de cartilha" -não há no momento emissão desenfreada de moeda, uma política de austeridade não- declarada vem sendo praticada e o "Mercado" tem sido beneficiado com todo tipo de desregulamentação ou, lembrando outro ministro, a boiada está passando furiosamente.

A presente situação brasileira é o retrato vivo da falência dos dogmas liberais e neoliberais. Ainda nos anos 90, o historiador liberal e brasilianista Thomas Skidmore afirmava que as elites econômicas brasileiras manuseiam um discurso liberal intelectualmente grosseiro, falacioso, simplório, caricato, ingênuo e, em última instância, deletério para a sociedade brasileira e para a própria economia. 

Uma elite econômica, ainda segundo Skidmore, que clama por medidas ultraliberais e depois reclama quando sofre as consequências das mesmas. A meu turno, acrescento que o povão (aí incluída boa parte da classe média supostamente instruída) aplaude esses discursos que mal compreende e depois sofre no bolso e na carne.

Em 2018 esse povão, incluindo os ignorantes diplomados, elegeu para presidente um sujeito que quase se orgulhava de não entender nada de economia e transferia toda responsabilidade ao guru Paulo Guedes, então apelidado de "Posto Ipiranga".

Guedes, cujas limitações intelectuais ficam patentes a cada vez que abre a boca, herdou de Dilma e Temer uma conjuntura econômica nacional e internacional absurdamente complexa e delicada que acreditava poder sanar aplicando rigorosamente uma cartilha ultraliberal rasteira, idealizada e completamente alienada da realidade.

Agora rei está nu - e só os inteligentes querem ver.



Nenhum comentário: